Os novos desafios dos empreendedores na visão de Alexandre Meireles

Em entrevista exclusiva à Revista Business Portugal, Alexandre Meireles, o presidente da ANJE – Associação Nacional de Jovens Empresários -, falou dos novos desafios que as empresas e os empresários enfrentam no contexto nacional, face ao novo paradigma que vivemos.
Chegou à presidência da ANJE no início deste ano, assumindo o compromisso de continuar a apoiar os empreendedores e ajudar a despertar esse espírito entre os jovens, mobilizando-os para uma cultura de risco associada à iniciativa empresarial. Essa tarefa tornou-se agora mais difícil, ou os tempos de crise privilegiam a criação e destaque de negócios inovadores?
Os empreendedores são resilientes e estão habituados a enfrentar desafios. Contudo, estou consciente que a crise provocada pela pandemia é algo sem precedentes e que não bastam soluções criativas para enfrentar o contexto atual, precisamos de medidas concretas de apoio. Por isso, a ANJE apresentou ao Governo um conjunto de propostas e recomendações para apoiar a tesouraria das empresas, salvaguardar a produção nacional, proteger o emprego e relançar o investimento durante a atual crise pandémica. Estas medidas visam não apenas preservar as empresas e o emprego, mas também relançar o investimento. Para nós, é fundamental garantir a sobrevivência das empresas sem deixar, em simultâneo, de preparar a recuperação económica após a crise pandémica. Vai ser necessário um grande esforço nacional e europeu de dinamização da economia, pelo que nos parece pertinente criar, já hoje, as bases para a retoma do investimento.
Uma das principais estratégias da ANJE também se prendia com o apoio nos processos da transformação digital das empresas. Essa estratégia foi reforçada com este novo paradigma que vivemos?
Claro que sim, a crise pandémica está a acelerar a transformação digital. A sociedade começou a organizar-se de forma a evitar o contacto humano próximo e isso já está a ter repercussões nas atividades económicas, no mercado de trabalho e no relacionamento interpessoal. É por demais evidente a necessidade de as empresas estarem preparadas para produzir e comercializar os seus bens, prestar os seus serviços, interagir com os seus clientes e fornecedores e desenvolver as suas atividades laborais remotamente. Para tanto, há que incorporar tecnologias digitais em toda a cadeia de valor das empresas, o que obriga a mudanças nos modelos de negócio, nos processos internos e na relação com os stakeholders.
A aceleração da transformação digital pode ser uma das poucas boas notícias deste contexto atual que estamos a viver. Bem sei que as empresas vão sair muito enfraquecidas desta crise pandémica. Mas a recuperação do tecido empresarial também passa pela digitalização dos modelos de negócio, parecendo-me pertinente haver incentivos públicos para que isso se concretize. Para as empresas portuguesas, a transformação digital é uma oportunidade para melhorarem a eficiência interna, ganharem maior capacidade de internacionalização, acompanharem os novos hábitos de consumo e estreitarem as relações com os clientes. É inevitável a evolução da nossa economia para o digital e a ANJE quer apoiar os seus associados neste caminho.
Enquanto empresário que já teve vários sucessos, mas que também já lidou com o fecho de uma empresa; e enquanto presidente da ANJE, quais considera serem os maiores desafios e obstáculos que as empresas têm a enfrentar, na sequência da pandemia?
O ecossistema empreendedor português continua a revelar dinamismo e inovação, apesar da paralisia quase total da atividade económica, mas os desafios são muitos. Por isso importa não só garantir a sobrevivência das start-ups que compõem o ecossistema, como começar já a pensar na retoma do investimento no empreendedorismo. O Governo já apresentou um pacote de medidas de apoio às start-ups no valor de 25 milhões de euros, reconhecendo deste modo a especificidade dos projetos de empreendedorismo. É um primeiro passo para assegurar a sobrevivência de empresas early stage e relançar o investimento no ecossistema empreendedor. Mas, ultrapassada a crise pandémica, temos de ser mais ambiciosos nos incentivos ao empreendedorismo. A pandemia está a acelerar as tendências da economia digital e Portugal não pode ficar para trás.
Quais as principais apreensões que os empresários têm demonstrado? E o que é que esta pandemia veio exigir deles?
No início da pandemia, a maior apreensão dos empresários estava relacionada com a forma como se iriam adaptar a esta nova realidade. As empresas onde os colaboradores já estavam motivados tiveram mais facilidade em encontrar novas soluções e responder às exigências que o contexto exigia.
O confinamento trouxe novas exigências: colocar os trabalhadores em teletrabalho e, em muitos casos, reinventar o negócio. Esta realidade veio acelerar a necessidade de digitalização e eu acredito que essa transformação de processos ainda agora começou, porque o contexto irá manter-se ainda por algum tempo. Agora, penso que o que se tornou um desafio, pode rapidamente ser uma oportunidade de crescimento para as empresas.
Fazendo parte de uma Associação que conta com uma visão ampla em vários sectores, como prevê que seja a recuperação do mundo empresarial português? Qual deve ser a estratégia das empresas e por onde deve passar a gestão das mesmas?
As empresas vão ter de encontrar novos caminhos, novos públicos e otimizar os seus processos e as suas estruturas para enfrentar os desafios futuros. Essa estratégia passa pela transformação digital, principalmente das PMEs. A transformação digital deve, por isso, ser acompanhada de um esforço de promoção da literacia informática. Ora, isto exige muita formação tecnológica e reconversão profissional, para que as pessoas adaptem as suas competências à vertiginosa evolução das necessidades do mercado de trabalho. Acredito que as tecnologias digitais vão criar oportunidades de emprego, desde que as sociedades saibam qualificar os seus cidadãos de forma a conferir-lhes capacidade de adaptação. Os gestores têm que ser mais flexíveis e encontrar soluções mais criativas para endereçar novos públicos e, nalguns casos, reconquistar os portugueses.
Como pode Portugal voltar a ter uma economia competitiva e quais acredita serem os principais motores de crescimento do nosso país?
A crise atual não nos pode afastar das mudanças necessárias. Portugal precisa de apostar na sua reindustrialização e deixar de estar tão dependente dos serviços. A ANJE sempre defendeu que a nova geração de empreendedores poderá ter uma palavra a dizer nesta estratégia de trazer valor para o país. Temos de apostar no conhecimento cientifico e tecnológico para investir em novos produtos, em sectores competitivos como energias ou eletrónica.
Na sua opinião, que medidas é que o Governo deve tomar para apoiar as empresas? No caso particular da ANJE, como se propõe a ajudar os vossos associados?
Como referi anteriormente, a ANJE apresentou ao Governo um conjunto de medidas que visam apoiar os empreendedores e as suas empresas. Após recolhermos contributos dos nossos associados, compilámos um conjunto de medidas que consideramos fundamentais para ultrapassar a crise e pensar no futuro. O pacote de medidas incide em apoios à tesouraria e em incentivos à capitalização, de forma a acudir à quebra de liquidez das empresas resultante da paralisia da atividade económica. Os apoios públicos às empresas afetadas pela pandemia de Covid-19 são muito importantes, mas necessitam de ser agilizados e complementados. Para nós, é fundamental garantir a sobrevivência das empresas sem deixar, em simultâneo, de preparar a recuperação económica após a crise pandémica. Vai ser necessário um grande esforço nacional e europeu de dinamização da economia, pelo que nos parece pertinente criar, já hoje, as bases para a retoma do investimento.