Queremos um país exigente e a crescer

Vivemos novamente um tempo politicamente conturbado. As eleições legislativas são a 10 de março — uma eternidade. Depois disso, ainda vamos ter de esperar pela tomada de posse e aguardar que todos os ministros se instalem. Se houver mudanças na orgânica do Governo, isto é, novos ministérios e secretarias de Estado, tudo isso terá de ser aprovado e concretizado. Seja qual for o partido que ganhe as eleições, o Orçamento do Estado também provavelmente será revisto e alterado.  Ou seja, haverá quase de certeza um Orçamento Retificativo porque haverá um novo Primeiro-ministro. Habitualmente, Portugal anda devagar, demasiado devagar — mesmo quando existe estabilidade política. Esta marcha lenta que enfrentamos agora tem consequências práticas para a economia: os processos ficam semi-parados e o investimento não sai do papel. O que é absolutamente terrível face às circunstâncias que atravessamos. Perde-se muitas vezes aquilo que os gestores chamem «time to market» — o momento ideal, do ponto de vista do mercado, para avançar e colher mais frutos.

 

Armindo Monteiro, Presidente da CIP

Ora bem, tudo isto é ainda pior quando a dúvida política se instala, quando não há qualquer espécie de certeza sobre a próxima composição do quadro parlamentar — e qual a força e sustentação do Governo que se segue. A situação torna-se logicamente ainda mais complexa. Se estava tudo muito parado, mais parado está agora. As consequências são terríveis para a economia.  Subitamente, entrámos numa espécie de longo túnel cuja saída não sabemos bem onde nos conduzirá.

Mas tem mesmo de ser assim? Vamos pôr de lado o resultado das próximas eleições. Logo veremos o que nos espera e qual o sentido de votos dos portugueses.  Concentremo-nos, primeiro, neste período até 10 de março, dia das legislativas. O que pode um governo de gestão fazer durante este período? A resposta que ouvimos vai quase sempre no mesmo sentido: um governo nestas circunstâncias pode fazer muito pouco. Está amarrado e limitado a um par de ações.

E, no entanto, há tanto a fazer: investimentos públicos, PRR, Portugal 2030 estão na linha da frente. Mas não podemos esquecer os milhares de processos em trânsito pela administração pública. Todos sabemos que estes períodos tornam a administração pública ainda mais cautelosa. Eu até arrisco dizer: excessivamente cautelosa.  A CIP está naturalmente muito preocupada com esta paragem. Ora bem, eu penso que seja importante que os portugueses se juntem a esta preocupação.

Reparem que, há apenas cinco meses, o Ministro da Economia e do Mar dizia que esperava que chegássemos ao fim deste ano com um crescimento económico próximo dos 3%. Dias depois, o Banco de Portugal, um pouco mais cauteloso, reviu em alta as suas projeções: crescimento de 2,7% em 2023 e de 2,4% em 2024.  As previsões eram, então, de que a atividade continuasse a expandir-se, com variações em cadeia razoáveis ao longo do resto do ano.

Em outubro, o cenário traçado pelo mesmo Banco de Portugal passou a ser muito diferente. »A atividade económica, diz o BdP, terá estagnado no segundo e terceiro trimestres e deverá manter um crescimento fraco até ao final do ano». E mais: «A economia portuguesa deverá crescer a um ritmo inferior ao potencial, com taxas de variação do PIB de 2,1% em 2023 e de 1,5% em 2024».

Num curtíssimo período de tempo, sem que tenhamos assistido a nenhuma alteração estrutural digna de nota, nem a qualquer acontecimento imprevisível e marcante — faço notar que o ataque terrorista contra Israel foi posterior — as previsões económicas para os próximos meses e para o próximo ano mudaram. O principal fator na base desta mudança foi o desempenho surpreendente das exportações no início do ano de 2023. Esta tendência foi encarada como sólida e persistente, quando, afinal, revelou-se um fenómeno pontual. As exportações de bens estão em queda, consecutivamente, nos últimos cinco meses. Ora bem, algo que poderia contrariar as perspetivas medíocres de um crescimento tão fraco 2024 seria uma mudança estrutural na política económica, refletida na proposta de Orçamento do Estado para 2024.

Como sabemos, essa mudança estrutural foi proposta e defendida pela CIP no Pacto Social. O Pacto Social foi uma tentativa de romper com o determinismo das previsões que prolongam o caminho de fraco crescimento e fracos aumentos de produtividade ao longo das duas últimas décadas.  Este caminho tem levado a um empobrecimento relativo de Portugal no seio da União Europeia. Países que, há 20 anos, tinham níveis de PIB per capita de cerca de um terço do nosso convergiram e ultrapassaram-nos. Portugal divergiu.

Não podemos aceitar esta situação. A CIP vai continuar a bater-se para que Portugal deixe de se contentar com tão pouco — em vez de ambicionar chegar rapidamente aos lugares cimeiros da Europa. Quando? Já em 2030.

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