A oftalmologia no pós-pandemia

A Oftalconde nasceu em Matosinhos e foi com o Dr. Eduardo Conde que deu os seus primeiros passos. A sala de espera estendia-se pelas escadas e as horas corriam pela noite dentro. Os equipamentos desse tempo, sobriamente clássicos, continuam na Oftalconde de hoje – situada na Avenida da Boavista, Porto – meticulosamente cuidados a cumprir os seus papéis; servir a avaliação técnica dos pacientes e lembrar o que de essencial transitou desse tempo: a relação médico-paciente. Foi assim que nasceu a Oftalconde e muitas outras clínicas pelo país. A relação médico-paciente serviu-lhes de base e a esta, um misto equilibrado de conhecimento, capacidade técnica e confiança. São essencialmente estes três conceitos que construíram as clínicas diferenciadas nos últimos 40 anos. O exercício da medicina em geral e da oftalmologia em particular desdobrou-se num inúmero de novos exames auxiliares e procedimentos técnicos que evoluíram a uma velocidade vertiginosa. Estes multiplicaram custos e tempo despendido em exames mais complexos e cirurgias que procuram reabilitar quadros clínicos cada vez mais difíceis. Por outro lado, as regras de boa prática tornaram cada vez menos aceitáveis a resignação perante quadros aparentemente irresolúveis. Existem mais caminhos e soluções e a expertise necessária para fazer a escolha criteriosa é mais exigente. A escolha do tempo certo de intervenção, de rastreio ou de seguimento é imperiosa e fará a diferença no resultado independentemente do caminho escolhido.

Às clínicas clássicas sucederam as equipas que agregavam diferentes diferenciações. A oftalmologia pediátrica, neuroftalmologia, oculoplástica, superfície ocular, implanto-refractiva, retina médica ou cirúrgica, são nomes cada vez menos desconhecidos dos pacientes. O envolvimento complementar de duas ou três destas sub-especialidades deixou de ser a exceção e passou a ser a nova normalidade. O oftalmologista assistente passou a gerir a participação de colegas sub-especializados e das suas colaborações pontuais ou mais regulares. O plural passou a fazer parte do léxico dos pacientes; o meu oftalmologista foi substituído pelos meus oftalmologistas, sem nunca beliscar o papel do oftalmologista assistente. Os exames auxiliares que assistem as decisões destes sub-especialistas são cada vez mais importantes e informativos, porém mais complexos. A partilha de competências e entreajuda foi a nova regra, com beneficio claro na qualidade dos cuidados prestados e diminuição evidente do erro e da perda de oportunidade.

Tudo parecia corretamente alinhado e encaminhado até que emergiu uma pandemia. O medo e a restrição nos acessos competiram com a perceção da segurança e da urgência nos cuidados assistenciais. Os pacientes questionaram o risco-beneficio dos tratamentos e a possibilidade de serem diferidos no tempo sem compromisso da sua saúde.  Os cuidados de saúde foram direcionados para a pandemia e todas as fragilidades da prática que havíamos desenvolvido emergiram; a sub-especialização afastou-nos do quadro geral, a pesquisa do detalhe ofuscou muitas vezes o quadro geral. Emergiram excelentes especialistas em todas as áreas da oftalmologia, com cuidados exímios na sua área e expertise como nunca antes havíamos tido. Do trinómio conhecimento – capacidade técnica – confiança, havíamos acrescentado como nunca antes conhecimento e capacidade técnica esperando que estes se repercutissem numa relação diretamente proporcional na confiança.  Estávamos totalmente errados! ou pelo menos de forma substancial. A confiança dos pacientes é um bem precioso que se cultiva com presença e partilha, e a pandemia demonstrou bem isso.

Já diz a sabedoria popular: “Não há bem que sempre dure e mal que nunca acabe”. É necessário percorrer a pandemia e preparar o pós-pandemia. O momento é disruptivo. Social e economicamente mas sobretudo nas mentalidade que nos devem reger. Nunca como agora valorizamos a proximidade e a presença, mesmo quando procuramos na assistência à distância uma forma eficaz de compensar a sua impossibilidade. Nunca como agora valorizamos uma conversa, mesmo quando nos vemos obrigados a tê-la por meios telefónicos ou informáticos.

Nestes momentos disruptivos emergem novos modelos. Do caos emergirá uma nova ordem, mesmo que nos custe a vislumbrar o seu vulto. É momento de refletir e reconstruir o método e os procedimentos. Orientamos o rumo e a atividade sem certezas, mas com convicções fortes. O novo modelo deve privilegiar a multidisciplinaridade, não distante ou sequencial, antes a interação. Aumentar a rentabilidade do momento de contacto com o doente, com todas as opiniões e exames presentes, convidando-o à partilha da decisão no seu tratamento. Adicionalmente tornar a comunicação mais eficaz e pessoal, mesmo quando à distância ou com recurso a ferramentas de educação ao paciente. A comunicação será o maior desafio. Mais do que ensinar ou educar, devemos orientar a aprendizagem do paciente perante o desafio da sua doença. Hoje, a informação está ao alcance de todos e devemos, conscientes desse facto, orientar a informação que o paciente procura em vez de lhes impor um modelo ou um conhecimento formatado, seja este no sentido da cura ou de “simplesmente” viver com a sua doença. De igual modo, aprender a compreender as necessidades dos pacientes na sua hierarquia de valoração em vez de lhes impor o tratamento que nos pareça simplesmente o mais correto.

Enganem-se aqueles que acham que o distanciamento fará parte do caminho do futuro. Entre as muitas duvidas que emergem no momento que vivemos, talvez a única certeza seja que qualquer relação deverá sempre passar por equilibrar conhecimento, capacidade técnica e confiança, ou seja pela relação entre o médico e o paciente que se acompanham e juntos escolhem a solução terapêutica.

 

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