Os benefícios que a telemonitorização traz aos doentes e à prática clínica

Miguel Castelo-Branco, Professor Catedrático e Presidente da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade da Beira Interior

As doenças crónicas (bronquite crónica, diabetes, insuficiência cardíaca) e diversos fatores de risco entre os quais a hipertensão arterial, são para países como Portugal, na época em que vivemos, as causas principais de sofrimento e de morte. Mesmo considerando a importância que a Covid-19 tem desde que a pandemia se iniciou, as doenças crónicas não transmissíveis, grupo em que se classificam, mantêm a liderança. A redução do seu impacto passa, necessariamente, pela promoção da saúde e prevenção de doença, atuando ao nível dos fatores de risco, o que implica, em muitas delas, mudanças culturais e aumento do conhecimento sobre estes aspetos e focar a cada vez mais a atenção em relação às questões do ambiente.

Mas passa, também, pelos cuidados primários de saúde na deteção o mais precoce possível, de preferência ainda antes das doenças se desenvolverem e começarem a perturbar a vida das pessoas. Os rastreios são, também neste contexto, um aspeto primordial. As doenças crónicas são como o nome indica persistentes, as que estamos aqui a considerar, são geralmente para o resto da vida. Por isso, necessitam de tratamento, de vigilância, de um ajuste de tratamento em função da evolução. Todas as patologias podem apresentar períodos de estabilização, geralmente designados por fase compensada, com episódios de descompensação.

Uma particularidade do presente é a associação de mais de uma doença crónica, devido a que muitas delas partilham mecanismos comuns e existindo uma elevada prevalência das mesmas.

Em parte, o aumento da esperança de vida à nascença devido, também, aos melhores cuidados de saúde permite, igualmente, sobrevivências acrescidas. Existe o conhecimento que o efeito das associações de doenças crónicas não resulta numa soma dos riscos, mas sim na potenciação dos mesmos. Nas últimas décadas, tem-se assistido a uma mudança na procura de soluções de acesso aos cuidados de saúde.

O tempo em que um médico era responsável por todos os problemas de saúde de uma pessoa já passou e há muito que foi transferido para o foco de diversas especialidades, outras profissões e para a necessidade de trabalhar em equipa. Esta mudança de paradigma tem sido extremamente desafiante, e, mesmo em muitas situações, ainda não resolvida tem levantado problemas, vejam-se as situações de rotura dos serviços de urgência, que em muitos casos, são apenas a ponta do iceberg de problemas em outras áreas. O modelo de acompanhamento de doentes com múltiplas doenças é algo que tem de facto que ser melhorado, incluindo o que deve ser feito quando há descompensações.

É muito vulgar um doente portador de uma destas doenças crónicas ter um plano de cuidados de saúde bem organizado, com acompanhamento periódico, uma vez que poderá fazer crises que requerem avaliação e revisão da intervenção. A tecnologia veio trazer novos possíveis componentes para o acompanhamento destes doentes permitindo alterar o modelo de atendimento e possibilitando que deixe de ser exclusivamente presencial.

Atualmente é possível, com ajuda de equipamentos, que o doente ou a sua família podem usar, assim como, tê-los em casa e transmitir informação usando a Internet das Coisas (“Internet of Things” – IoT), como, por exemplo, a glicemia, oximetria, pressão arterial, peso e muitos outros parâmetros. Cada vez mais, aumenta o número de parâmetros e esse facto é extremamente positivo. Além de que, esta ligação à equipa permite duma forma apoiada reforçar o papel do doente no seu autocontrolo.

Sendo que, a importância destas doenças aumentou em países desenvolvidos com o controlo de grande parte das doenças infecciosas bacterianas, devido à introdução dos antibióticos durante o século XX,mas também, consequência do próprio desenvolvimento, do seu impacto nos estilos de vida e na alimentação.

Hoje, é então possível, os doentes, em casa, fazerem monitorização de parâmetros necessários ao controlo da doença (dependendo da doença como, por exemplo: o açúcar no sangue, na diabetes; os níveis de oxigénio, na bronquite crónica e na insuficiência cardíaca), assim como, em outras situações no acompanhamento do doente, tais como, “saber como se sente”.

No âmbito do Centro Académico Clínico das Beiras existem linhas de investigação em curso que pretendem compreender melhor a integração da telemonitorização nos processos de acompanhamento dos doentes, por isso desenvolvemos instrumentos que permitem antecipar possíveis descompensações, tentando detetar mais cedo o agravamento da doença, e assim compensar o doente mais rapidamente possível.

É, por isso, importante compreender melhor o papel do doente no autocontrolo e valorizá-lo. Um dos projetos inclui a monitorização da qualidade do ar ambiente, permitindo inter-relacioná-la com as manifestações clínicas de doenças como a bronquite crónica. Ao mesmo tempo, diversas instituições de saúde do CACB têm implementado processos de telemonitorização integrados nos seus planos de cuidados aos doentes, que atualmente ainda englobam uma parte relativamente pequena dos doentes, mas que se espera vir a aumentar progressivamente.

Em desenvolvimento estão modelos de acompanhamento que integrando os meios hoje disponíveis, e os processos de atendimento (presencial, remoto e telemonitorização) possam obter melhores resultados em saúde e simultaneamente mais sustentáveis.

Ao mesmo tempo, estudam-se e desenvolvem-se soluções inovadoras que possam contribuir para a continuação da evolução de soluções cada vez mais práticas, com melhor impacto e maior sustentabilidade. Doentes com insuficiência cardíaca, hipertensão, bronquite crónica, diabetes e num futuro com outras situações, têm a oportunidade de beneficiar de processos cada vez mais efetivos de acompanhamento visando melhorar a sua qualidade de vida e prognóstico.

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