“O Direito Imobiliário é figura assídua no meu percurso profissional”
No universo da advocacia, a Dulcinda Guarita presta apoio geral e transversal, abarcando a grande maioria das valências do Direito, na procura de resposta às necessidades dos clientes. Em entrevista à Revista Business Portugal, a Advogada destaca o Direito Imobiliário como figura assídua no seu percurso profissional, sublinhando a importância da prestação de um serviço sério e responsável e de constante formação jurídica, para corresponder às expetativas dos clientes.
Como avalia o seu percurso profissional e o seu posicionamento atual? Volvidos 26 anos, que estratégia assume para que continue a ser uma referência e quais os fatores que continuam a distingui-la no mercado e que a permitem fidelizar os clientes?
O meu percurso profissional foi, tem sido, bastante consistente e equilibrado. Há 26 anos que exerço exclusivamente advocacia e creio que posso afirmar que o caminho não se demarcou especialmente por grandes oscilações – sem prejuízo, obviamente, da natural evolução que qualquer profissional vai alcançando -, antes pelo contrário, tem sido uma determinada estabilidade e consistência que me permitem ir acreditando no trabalho que desenvolvo. Hoje, sinto-me realizada com esta caminhada e considero que concretizei os meus objetivos profissionais.
Acima de tudo, o esforço, a permanência, a dinâmica, o foco, em suma, o profissionalismo ao serviço dos interesses daqueles que me procuram e continuam a depositar toda a confiança no meu trabalho, são os elementos que permitem alcançar a fidelização dos clientes. Trata-se de um contínuo investimento na excelência do serviço prestado.
Uma das áreas de atuação que assume especial relevo na sua atividade e em específico no seu percurso profissional é o Imobiliário. Porquê?
O Direito Imobiliário é figura assídua no meu percurso profissional.
Logo no início da minha carreira, por um acaso, comecei a prestar serviços jurídicos para uma Instituição Bancária em que, como Procuradora da mesma, assegurava a preparação de escrituras públicas precedida da devida análise da documentação dos imóveis e dos seus titulares, a realização das mesmas e subsequentes registos. Tudo no âmbito do crédito à habitação e, posteriormente, no leasing imobiliário. Esta prestação de serviços durou cerca de cinco anos, o que se traduziu num enorme conhecimento e domínio do Direito Imobiliário e, simultaneamente, dediquei-me em especial, a este ramo do Direito.
Acresceu que, no entretanto, passei a prestar apoio jurídico a mediadoras imobiliárias, essencialmente desenvolvendo as mesmas tarefas que referi a propósito do Banco e, por fim e, mais recentemente, tenho vindo a representar inúmeros investidores imobiliários, quer nacionais quer estrageiros, o que implica necessariamente, muita dedicação a este ramo do Direito.
Qual o leque de serviços que podem ser prestados pelo advogado, no âmbito do Direito Imobiliário?
A começar pelas “Due Diligence”, diligências prévias que, como é sabido, correspondem numa análise detalhada quer do objeto do negócio quer dos sujeitos intervenientes. Uma vez mais, destaca-se a prevenção como medida funcional e eficaz para evitar futuros conflitos.
Percorrida esta fase prévia e dependendo do tipo de negócio ou tema que se estará a tratar, o advogado tem competência para redigir contratos de promessa de compra e venda, contratos de arrendamento, contratos de empreitada, constituir propriedades horizontais, inscrever prédios novos, alterar os existentes – nas áreas, composições e confrontações – requerer destaques, divisões, constituir garantias reais, acessões, usucapiões, reservas de propriedade, licença de utilização, promover usufrutos, doações, registos prediais, averbamentos e/ou alterações à matriz, entre outros.
Acresce ainda que, ao abrigo do DL nº 116/2008 de 4 de Julho que veio regulamentar os chamados “Atos Notariais do Advogado”, o advogado passa a ter competência para, através do Documento Particular Autenticado (DPA), formalizar na generalidade, os negócios jurídicos referentes a imóveis, designadamente, celebrar contrato de compra e venda, doações, propriedades horizontais, entre outros. A todos estes atos a lei atribuiu o mesmo valor jurídico aos praticados por Notário.
Desta forma, fica agilizado e desburocratizado todo o procedimento das partes intervenientes sem afetar a necessária confiança jurídica na prática de tais atos.
Podemos dizer que a complexidade e a necessidade de especialização neste ramo do Direito são cada vez mais prementes, atenta a volatilidade do mercado? Como é que a Dulcinda se prepara e procura manter-se sempre a par da atualidade?
Sem dúvida que este ramo do Direito reveste especial complexidade, não só pela sua própria natureza jurídica, uma vez que lida diretamente com um dos direitos constitucionalmente consagrados no artigo 62º da Constituição da República Portuguesa, bem como no artigo 17º da Carta dos Direitos Fundamentais da EU – o direito de propriedade – como também, precisamente porque o mercado imobiliário é bastante volátil e sustenta vários tentáculos. Tudo isto torna imperioso que o Legislador lhe impute uma constante regulamentação e adaptação às novas realidades, sob pena de ser tornar desadequado e insuficiente, ficando a sua função subvertida.
Cingindo-nos a Portugal, como mero exemplo, veja-se nos últimos oito anos todas as novas realidades imobiliárias que surgiram e outras que foram alteradas e que por isso mesmo, carecem de uma total especialização dos profissionais que tratam diretamente com estas matérias: desde logo, o direito à propriedade e a forma que ele é entendido à luz da nossa legislação, o boom imobiliário que decorre e a que atualmente assistimos, a consecutiva regulamentação do alojamento local e do arrendamento, o investimento imobiliário e a captação de capitais estrangeiros, as novas regras referentes à propriedade horizontal e à compropriedade, as empreitadas, as servidões, o direito de superfície, a usucapião, o usufruto, a expropriação, as acessões. O Direito Imobiliário tem de traduzir-se na garantia jurídica da qual todas as matérias que refiro, carecem.
De facto, o Direito Imobiliário assume um elevado compromisso com a nossa sociedade, dado que se espera do mesmo que esteja à altura de corresponder às necessidades do mercado imobiliário e ao ritmo que este lhe impõe e que, como sabemos, beira o alucinante. Só fará sentido se acompanhar a prática das sociedades que pretende regulamentar.
Para corresponder às expetativas dos clientes, prestando um serviço sério e responsável, acima de tudo tem de haver a disponibilidade e disposição para nos mantermos em constante formação jurídica.
Quais considera serem os maiores desafios do advogado especialista em Direito Imobiliário?
Tem de possuir um abrangente conhecimento do Direito, já que esta especialidade tem ramificações para os demais ramos. Estar extremamente atento às mudanças do mercado, às novas necessidades do seus atores e, consequentemente, às constantes alterações legislativas decorrentes da volatilidade deste mercado.
O facto do mercado imobiliário ser um mercado forte em Portugal faz com que haja mais procura por este ramo do direito privado, o Direito Imobiliário? Como olha para o panorama atual neste sector?
A procura de acompanhamento jurídico nesta área tem vindo a aumentar bastante e a postura preventiva adotada pelos interessados que tanto invocamos e defendemos ser a chave do sucesso para a redução dos conflitos, tem assumido especial preponderância. Este comportamento social está a implantar-se na nossa sociedade com bastante destaque.
O mercado imobiliário em Portugal continua a crescer mas, em virtude de determinados fatores externos, designadamente o período pandémico de que acabamos de sair, a guerra na Ucrânia que afeta todo o mundo, não sendo Portugal exceção, a conjuntura económica de inflação com níveis alarmantes, a histórica revolução das taxas de juros, considero-o imprevisível.
Ainda assim, encaro o panorama atual expectante, mas com otimismo, pois é inquestionável que o mercado imobiliário continua a ser o responsável por grande parte da atração de investimento internacional no nosso país e é uma referência para o desenvolvimento económico.
Relativamente ao sector do Direito, visto como tradicionalista, quais considera serem as principais mudanças, desafios e oportunidades nos próximos anos?
Crê-se que, num futuro muito próximo (dois a quatro anos), a Inteligência Artificial (IA) será a grande revolução no mundo do Direito, não obstante já se encontrar implementada. Este sector considerado tradicionalista está prestes a romper com esta visão e a entrar na fase de “automação”. Cada vez mais, o Direito só é passível de ser exercido se estiver apoiado na tecnologia.
Se por um lado, existem efetivamente algumas tarefas no exercício da advocacia, repetitivas e mecânicas e, por esse facto, a transformação digital será um meio privilegiado para aumentar a eficiência e eficácia operacional; por outro, quando
passamos para o campo da subjetividade, da análise de comportamentos, fundamentos e motivações, para a relação de confiança e confidência tão procuradas e privilegiadas entre os advogados e os clientes, não é possível a replicação para a IA. Percebe-se pois que o futuro da advocacia não será liderado por máquinas, mas sim por profissionais, pessoas que se entregam e dedicam a cada caso individualizando-o, mas que, destaque-se, se adaptem às novas tecnologias.
A título pessoal e profissional, que objetivos e conquistas pretende concretizar? Que estratégia assume para que continue a ser uma referência?
Pessoalmente, ser eu mesma, percorrer a vida como o tenho feito até aqui, não há muito para dizer. Em termos profissionais, pretendo continuar a exercer advocacia, dando o meu melhor e também com um novo desafio “aí à porta” … Não me revejo afastada do mundo do Direito. Como alguém um dia me disse “o Direito é a tua terapia”.