Das raízes alentejanas nasceu Pêra-Grave

João Grave, Gerente

A Quinta de São José de Peramanca, no Alentejo, é a principal razão de hoje podermos beber vinhos Pêra-Grave. João Grave sucedeu ao seu pai na gestão da quinta e decidiu avançar com um negócio de vinhos que preservou o património vinícola da região. João conta toda a sua história à Revista Business Portugal e desvenda algumas das suas prospeções futuras.

João Grave é o filho de Joaquim Grave, a quem sucedeu como proprietário da Quinta de São José de Peramanca. Uma propriedade que já está na família há quatro gerações e sempre esteve ligada à agricultura e à criação de gado.

No momento em que João ficou encarregue da quinta, decidiu avançar com a produção de vinho, tendo plantado as primeiras vinhas em 2003 e feito o primeiro vinho em 2005. O atual proprietário é licenciado em gestão de empresas e possui uma vasta experiencia nesta área. Começou a trabalhar numa fábrica de rações para animais, adquiriu experiência em diversos ramos de atividade: comércio a retalho na área do vestuário, agro-pecuária, banca e agroindústria. Quando surgiu a possibilidade de gerir a quinta, João ainda tinha outras fontes de rendimento, o que lhe permitiu efetuar o investimento na vinha sem pressa: os 15,50 hectares de vinha foram plantados em quatro anos. Com o desenvolvimento do negócio, a propriedade foi-se transformando de um centro de custos puro, em um centro de resultados com autonomia económica e financeira. Para João, a Quinta divide-se em duas partes: uma rústica e uma urbana. A parte rústica já está rentabilizada com a vinha, o próximo desafio é rentabilizar a parte urbana, estando nesta altura em análise vários modelos de negócio, tendo sempre como âncora também o negócio do vinho, que na realidade é a raiz e o ADN principal desta Quinta.

Esta decisão não foi tomada de ânimo leve e dependeu de vários fatores, tais como as caraterísticas da própria quinta e a virtuosidade que a região já tinha pelos vinhos que eram ali produzidos. A região de Peramanca já é conhecida, há séculos, pelos seus bons vinhos. A mesma é principalmente conhecida pelo mercado brasileiro, que a conhece graças a quem descobriu o Brasil, Pedro Álvares Cabral. Este chegou ao país com um vinho desta região e essa história nunca mais foi esquecida – “Por acaso, os indígenas não gostaram do vinho, pois não estavam habituados ”, brinca João. No final do século XIX, os vinhos chegaram a ganhar várias medalhas, mas foi também por essa altura que o flagelo da filoxera veio terminar com o cultivo de vinha em quase todo o país, o terroir da Quinta de S. José de Peramanca não foi exceção. Em 2003, com a plantação das primeiras vinhas, assistimos de alguma forma ao reinício da história e do virtuosismo desta pequena região vinícola.

 

Mas porque é que a região tem assim tão bons vinhos? João explica que Peramanca é uma região com um manto de granito muito espesso, pelo que os níveis freáticos são muito superficiais, o que proporciona às plantas acesso à água mesmo durante períodos prolongados de ausência de chuva. Este fenómeno explica o facto de, em tempos antigos e muito antes da rega artificial, as “vinhas aqui sempre se terem dado tão bem”, acrescenta. Outra curiosidade é o nome da região, que provém do latim, e associa “Pêra” a pedra ou rocha e “Manca” a torta, ou seja, “Pedra Torta”. Mesmo no centro da vinha podemos ver a “Pedra Manca“ que, ainda hoje, repousa neste terroir e, cuja, serigrafia faz parte de todos os rótulos dos vinhos da casa.

O proprietário assume que fez um grande investimento financeiro e numa área em que “não se pode ter pressa”, sendo que o negócio do vinho é algo que se vai trabalhando:“ as marcas têm de fazer o seu caminho”. No começo, João investiu numa só marca, pêra-grave. Mais tarde, surge a pêra nova e a pêra velha são estas as três principais referências ainda hoje utilizadas. O Pêra-Grave é o vinho colheita e Reserva, enquanto o Pêra Velha é o topo de gama que só sai em anos em que a qualidade o justifica. Já o Pêra Nova é um vinho entrada de gama e que só se comercializa na loja do Produtor. A loja da Quinta tem sido uma grande ajuda neste projeto, permite ao proprietário pagar grande parte dos custos fixos da empresa e, ao mesmo tempo, promover a sua marca, tendo à venda todos os seus vinhos. A juntar a estes, também vendem alguns vinhos que João intitula de “garrafeira de produtor”, ou seja, colheitas antigas que já não se encontram no mercado: “Acho interessante poder-se visitar o produtor e encontrar vinhos que já não há cá fora”, explica, para além do valor acrescentado que a sua venda traz para o negócio. Também são vendidos produtos típicos, tais como, azeite, doces, bacalhau de escabeche, geleias, chutneys, entre outros. E por fim, os acessórios de vinho também não poderiam faltar. Toda esta diversidade de produtos e vinhos é disponibilizada aos clientes já fidelizados e aos que se deslocam de vários pontos do país para ir comprar ali, mas também a muitos turistas que acabam por encontrar a loja. João confessa que não esperava que a loja tivesse o impacto que tem. “É um cartão de visita à entrada de Évora”, destaca.

Na escolha das castas, houve a preocupação de escolher variedades com uma boa acidez “que consigam envelhecer bem”, “Acidez nos vinhos quer dizer frescura. E quer dizer durabilidade”, explica João. O principal objetivo é que o vinho tenha vivacidade para aguentar com o tempo. As castas tintas predominantes são a Touriga Nacional, Alicante Bouschet, Cabernet Sauvignon, Syrah e Petit Syrah, enquanto nas uvas brancas podemos encontrar três castas portuguesas; Arinto, Verdelho e Alvarinho. No ano 2015, o empresário teve o privilégio de ficar, com o Pêra-Grave Reserva tinto 2011, no top 10 da Prowine de São Paulo, a mais importante feira de vinhos da América Latina. O mesmo vinho foi considerado o melhor vinho tinto do velho mundo (Península Ibérica). João afirma que este foi o vinho que os lançou no Brasil e lhe trouxe muito sucesso, fazendo esgotar o stock naquele exato momento. A Reserva 2011 é considerado um vinho concentrado, suave e, ao mesmo tempo, muito bem harmonizado: “Foi um vinho com uma estrutura e um corpo fantástico”, acrescenta João e, o mais importante: “ Fica sempre na memória de quem o prova”.

“O facto de ter outras ocupações quando iniciei este negócio, levou-me a tentar conceber uma estrutura leve e fácil de gerir. Assim, as nossas vendas assentam principalmente em distribuidores. Para compensar , e de forma a trabalhar o cliente final, abrimos a nossa loja do produtor que tem sido um grande sucesso. Como dizem os americanos o fator decisivo para o sucesso é : 1º Location, 2º Location e 3º Location. Temos a felicidade da nossa localização ser excelente e esse facto tem ajudado de forma significativa: a nossa loja é sem dúvida um dos nossos principais “clientes”. Neste momento, estamos finalmente a contruir a adega aqui na Quinta. Foi-me sugerido muitas vezes realizar este investimento desde já há algum tempo. Na minha opinião, num projeto com a nossa dimensão, 15 hectares, a realização do investimento da adega antes do tempo pode significar o princípio do fim. Consolidar primeiro o negócio e as marcas parece-me mais prudente em termos de gestão e comporta um risco bastante inferior, e também lhe digo que a construção da adega não é, na minha perspetiva, uma decisão baseada em critérios económicos, mas sim de qualidade e controlo.

Aqui em casa produzimos os vinhos a pensar no consumidor, claro que é sempre bom e importante ganhar prémios nos concursos, mas o que nos enche de alegria é quando aquele consumidor que diz “eu não percebo nada de vinhos, só sei se gosto ou não gosto”, depois de provar um dos nossos vinhos, exclama; “muito bom, dê-me uma caixa por favor”. Aí, sim, já ganhámos o dia, pois não só ganhámos um cliente, como no futuro ele terá tendência de repetir a compra e recomendar o nosso produto a outras pessoas. Quanto a perspetivas de crescimento, o foco estará sempre na rentabilidade e não na escala ou quantidade. As marcas têm o seu preço “tabelado” pelo mercado e não é fácil alterá-lo. “Estar frequentemente a arranjar novas marcas para poder ter preços diferentes também não me parece o caminho num negócio com a nossa dimensão”. A solução, no entender de João Grave , é a de aumentar a % dos vinhos premium no mix total de vendas, para isso é importante ter um grande foco na qualidade e na relação qualidade preço, não só no mercado nacional como no de exportação. “Sem exportações não se consegue crescer. Quando se fala em relação qualidade preço as pessoas têm tendência em associar a produtos baratos. Não tem que ser assim, quando falo nessa relação, refiro-me a compararmo-nos com vinhos de preços elevados e oferecer uma alternativa mais acessível mas também com preços que defendam uma boa rentabilidade”.

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