“O segredo é reinventar-nos todos os dias”

Para João Marques o segredo é acreditar no que se faz e nos sonhos que se quer atingir. Em entrevista à Revista Business Portugal, o Gerente assume que o próximo objetivo da Casa Fernandes é dar o passo para a internacionalização.

A Casa Fernandes começou por ser uma casa agrícola, uma das maiores empregadoras do concelho de Oleiros e grande dinamizadora da agricultura, tendo hoje na base do negócio a olivicultura, floresta e imobiliário. Como se deu esta transição?

É verdade, fomos uma das maiores empregadoras do Concelho de Oleiros. Esta transição dá-se numa fase em não existia uma aposta na rentabilização das várias vertentes de negócio, em que o próprio tempo acabou por estagnar a dinâmica desta casa.

João Marques, Gerente

Foi assim por diversos acontecimentos e adversidades. Assim, quisemos alterar a forma de trabalhar, inovando e utilizando as bases já existentes para com uma nova veia empreendedora criar novos negócios e recuperar outros. Tornamo-nos claramente, numa empresa novamente investidora.

No entanto, o azeite é a grande aposta do negócio e que vos diferencia no mercado e que está presente em muitas lojas tradicionais em Lisboa e outras regiões, em restaurantes e grandes grupos hoteleiros. O que leva todos eles a escolherem o vosso produto?

Não é minha intenção ser polémico ou querer a verdade absoluta da produção de azeite. Há lugar e espaço para todos e ainda muito para aprender. Para além de se poder fazer neste momento diversos azeites no mercado com características bastante distintas, eu ao contrário de muitos colegas meus, não acho que os consumidores tenham que ser “Educados para a prova de azeite”. Sou um defensor até, que nos concursos nacionais e internacionais das escolhas dos melhores azeites, os júris fossem constituídos por consumidores e não produtores. É uma opinião muito própria. Os lagares de prensas são muitas vezes olhados com desconfiança, um erro, na minha opinião! Obviamente que houve transformação e inovação no processo de colheita e produção, mas o que nos distingue, ainda é a opção por um azeite monovarietal, constituído por azeitona “Galega” da Beira Baixa, a fase de maturação do fruto na colheita e mantemos unicamente ainda o processo de decantação. Eu digo e continuarei a dizer que é o “Azeite puro”. Obviamente que as outras fases já são feitas automaticamente e seria muito fácil colocar uma linha contínua, mas, continuamos a apostar neste processo. O nosso azeite é escolhido simplesmente pela prova do cliente. Queremos um azeite mais doce e suave que possa ser identificado como de uma região, de uma terra. Os consumidores, que procuram um azeite com essas características, conseguem-no encontrar no nosso produto e quando nos dizem que é dos melhores que já provaram, descrevendo lembranças ou sensações, dá-nos uma satisfação enorme. Depois existe uma relação de muita proximidade com todos eles, são para nós amigos e parceiros que podem sempre contar com a “Casa Fernandes”.

O percurso, desde 2010, tem sido pautado por um crescimento em todas as vertentes de negócio, tendo tido um grande revés com os incêndios de 2017 e viram-se obrigados a recomeçar do zero. Apesar dos percalços, o balanço até aqui é positivo?

De Facto. O percurso não foi fácil, quando em 2017 já existia um caminho percorrido, os incêndios acabam por destruir a aposta na floresta, os novos olivais e tragicamente parte da receção do nosso lagar. Foi recomeçar do zero, quer para os projetos ambicionados, quer para mim próprio, quando abdico de um emprego estável na minha área de formação e me dedico exclusivamente aos negócios da empresa. Sempre acreditei que era possível, e cá estamos hoje com um grande aumento da área florestal adquirida e replantada, com a requalificação completa do nosso imobiliário no mercado de arrendamento e com um marca de azeite pujante, que consegue atrair novos clientes, chegar a novos mercados e a surpreender os que nos querem conhecer. O balanço só pode ser positivo.

O João Marques tem um espírito de investidor, de criar riqueza, principalmente numa zona do interior, já por si desfavorecida e esquecida, mas que tem as suas vantagens. Enquanto gestor, o segredo é reinventar formas alternativas de chegar ao cliente?

O segredo é reinventar-nos todos os dias. O segredo é acreditar no que fazemos e nos sonhos que queremos atingir. O segredo é o trabalho realizado com paixão. Não vale a pena estar a falar dos problemas do interior, todos os conhecem, mas poucos os querem resolver! Aqui temos que mostrar que também cá existe gente com ambição, competência e vontade de viver e trabalhar. Costumo dizer com frequência que como gestor e empresário temos que nos antecipar e fazer escolhas. Acertamos e erramos, mas só acertando mais vezes e aprendendo comos erros, conseguimos atingir os nossos objetivos. Além disso, acredito piamente que podemos ter sucesso no interior, criar riqueza e postos de trabalho. O que ainda me choca é o nauseante e asqueroso preconceito de que, por estas terras, somos uns meros provincianos acanhados atrás da serra!

Isso está a mudar, mas com muito caminho a percorrer.

A fileira do Medronho e do turismo são objetivos e áreas em que querem estar envolvidos. Como se traduz, na prática, esta vontade?

São, sem dúvida. Na minha opinião, são áreas de muito futuro no interior. Com a pandemia, os Portugueses quiseram conhecer o nosso país e a nossa região ganhou com isso. Temos paisagens únicas, gastronomia, praias fluviais, história, alguns monumentos religiosos de grande beleza, mas, acima de tudo temos o silêncio. O turismo do silêncio é cada vez mais procurado, e aqui, a oferta é infinita. Posso adiantar que já tenho a ideia do turismo que pretendo implementar e já fiz alguns contactos para começarmos a trabalhar, nesse projeto. Quanto à fileira do medronho, não escondo que é uma aposta forte, plantamos já cerca de 3500 e queremos continuar a realizar novas plantações. Nesta região o medronho é um produto de altíssima qualidade e para além disso, existem muitos produtores que continuam a ter a sua pequena produção. O objetivo passa pela criação de uma marca e de um espaço onde possamos produzir a nossa aguardente, assim como, comprar o fruto a produtores locais e regionais. Não só estamos a investir, como a criar uma dinâmica social e económica na região o que deve ser uma preocupação também hoje dos empresários. Não podemos somente olhar ao lucro, mas também às dinâmicas da sociedade e sobretudo tentar impulsionar as pessoas para a motivação de investimento numa área de qualidade e que já existe.

O objetivo da Casa Fernandes era dar o passo para a internacionalização, mas que ficou suspenso devido à escassez da matéria-prima. Já é possível, neste momento, repensar nesse objetivo para um futuro próximo?

É, e já o conseguimos fazer. Como tenho referido, a internacionalização é um dos nossos objetivos. Este ano já tivemos a experiencia de alguma exportação para o mercado da Saudade, nomeadamente para França. Tive há pouco tempo uma oferta para exportação para o Luxemburgo, e Angola, mas, com cerca de 35 hectares de olival novo a matéria-prima, continua a ser pouca para a atual procura. A nossa prioridade neste momento, passa pela construção do novo pavilhão que vai albergar uma nova linha de enchimento, rotulamento e embalamento, o que está previsto para o início de Agosto. Será um novo impulso e tonar-nos-á mais eficazes e eficientes neste processo.

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