Cepsa: Vice-presidente da Cepsa Portuguesa na 5ª Grande Conferência de Liderança Feminina
Ruth Breitenfeld foi uma das oradoras na conferência que se realizou no passado mês de outubro no Fórum Lisboa. Como exemplo de carreira e profissionalismo, no feminino, a Revista Business Portugal aproveitou o momento para entrevistar a mulher por detrás da empresária.
Mais do que portuguesa, a Ruth é uma cidadã do mundo, certo?
Sim, eu nasci em Angola, a minha mãe é meia espanhola, meia portuguesa e o meu pai é alemão. Vivi em Angola, na Namíbia, no Brasil e agora vivo entre Portugal e Espanha, em vai e vem de avião. Para além de tudo isto, os meus pais acharam que era pouca a diversidade, por isso arranjaram-me uns padrinhos gregos.
Então podemos começar por fazer uma breve apresentação sua e do seu percurso até chegar à Cepsa. Como é que pode apresentar o seu percurso profissional?
A minha formação foi em direito. Eu sou advogada de base, que é uma formação, na minha opinião, muito rica, que permite tocar em muitos pontos. Os meus primeiros trabalhos foram a dar explicações, fazer traduções, até a trabalhar numa loja de brinquedos e também, a determinada altura, ser secretária de administração. Portanto, tinha empregos daqueles que nós temos durante a faculdade, para fazer e aprender coisas. Comecei a trabalhar num escritório de advogados, ainda na faculdade, para ver como era a vida e para ver como se faziam as coisas na prática. Foi muito interessante e aprendi muito, porque tive a sorte de trabalhar com um advogado que me fez ir às prisões, às conservatórias, aos tribunais, para ter contacto com a realidade que me esperava.
O meu primeiro trabalho depois da faculdade foi numa empresa de consultoria de investimentos estrangeiros. Na altura, nos anos 80, a consultoria de investimento estrangeiro estava em voga em Portugal porque tínhamos acabado de aderir à CEE.
Depois, passei para um escritório de advogados que, na altura, era pioneiro em direito europeu e estive quatros anos lá como freelancer. Entretanto, surgiu uma oportunidade na BP, que estava a contratar advogados para in house, e eu como trabalhava muito com empresas, achei que era interessante a experiência como advogado interno. Decidi fazer essa experiência por dois anos. Não voltei a sair do mundo das empresas. Fui para a BP, para trabalhar em assessoria jurídica numa fase muito interessante, de muitas mudanças, onde aprendi muito e onde entrei, em 1991, para o mundo dos petróleos, o mundo da energia.
Entretanto, em 2006, fui convidada para ir para a Cepsa Portuguesa que, na altura, queria estruturar, organizar de uma forma diferente e criar a sua assessoria jurídica interna dentro daquilo que era a norma no grupo. Claro que já havia suporte legal da companhia, mas era dado por um advogado externo e por uma advogada mais júnior que estava na empresa. Foi quando aceitei o desafio de desenvolver essa assessoria jurídica na Cepsa, depois de 14 anos numa outra empresa
Chegou ao mundo Cepsa já num cargo de liderança. E na BP já tinha um cargo de liderança?
Eu era uma senior legal advisor, era a número dois na assessoria jurídica. Passo para a Cepsa como número um nessa tarefa.
Sentiu que a Cepsa tem mais abertura à ascensão feminina dentro da empresa? Ou foi algo que evoluiu?
Na Cepsa já encontrei mulheres em departamentos com cargos de responsabilidade. Não sei se é uma questão de abertura ou não, a Cepsa foi buscar-me não por eu ser mulher, mas pelas características profissionais que tinha e pelo meu conhecimento do mercado. Em termos de abertura, eu nunca senti que a empresa estivesse fechada ou que isso fosse um critério para ir buscar alguém ao mercado. O critério era o de encontrar a pessoa com o perfil mais adequado para aquilo que a empresa queria fazer naquele momento.
A nossa pergunta vai no sentido de perceber se a Cepsa tem acompanhado a realidade atual das empresas portuguesas, em que se denota uma maior abertura ao crescimento das mulheres nos quadros internos das mesmas. Notou essa evolução ao longo dos anos?
As empresas são mundos vivos, são organismos vivos que acompanham os ritmos da sociedade e, sempre que possível, puxam pelas mudanças na sociedade. A Cepsa foi uma empresa que nestes últimos anos – eu estou cá desde 2006, portanto já lá vão 13 anos – abriu-se ao mercado de uma forma espetacular, não especificamente nesta vertente, porque eu nunca senti nenhuma discriminação, nem nenhum entrave – e eu acho que se existisse algum entrave, eu não estaria no cargo onde estou agora -, mas abriu muito, porque o mercado mudou, as exigências são outras e nós somos uma companhia de energia que abraça e assume integralmente os princípios da diversidade, da inclusão.
Enquanto vice-presidente da Cepsa Portuguesa, qual foi o seu maior desafio?
O desafio são sempre as pessoas. Isto soa a chavão, mas não é, porque realmente as pessoas são mundos próprios, cada um com as suas características. É um facto que as empresas, e a nossa empresa em particular, têm assumido já há uns anos, e agora mais claramente do que nunca, que esse mundo tem de se refletir na nossa realidade.
Para mim, o maior desafio é continuar a ter a capacidade de criar pontes e de construir pontes entre realidades diferentes e nós temos realidades diferentes em Portugal, temos realidades diferentes em Espanha, nós somos absolutamente integrados em termos de matriz. Portanto, temos de ter a capacidade de encontrar os pontos de encontro e de desconstruir o que nos pode separar.
Foi nesse seguimento que a Cepsa assinou a carta portuguesa para a diversidade?
Também em Portugal, dentro de um marco que, para nós, foi o dia da diversidade, foi criado e implementado em todo o Grupo aquilo que é o esperado quando se assina uma carta desta natureza. O que nós fizemos foi assinar, no dia 12 de setembro, a carta da diversidade. São princípios e é uma responsabilidade que nos é exigida. Não é só praticar, não é só fazermos algo de forma informal, é assumir isso como compromisso formal da companhia, com objetivos concretos e, portanto, monitorizáveis.
Por onde passa esse compromisso? Quais são os objetivos a que a Cepsa se propõe?
Nós temos uma lista de objetivos muito grande, mas há objetivos muito concretos, focados especificamente em quatro vetores: a vertente do género, que pretende promover um ambiente ainda mais propício ao crescimento das carreiras das mulheres; a vertente geracional, porque nas empresas há um talento que não podemos esquecer, que é aquele onde eu estou (em termos de idade); uma vertente na área das incapacidades, porque também temos de saber trabalhar essa vertente; e, naturalmente, um projeto no âmbito cultural, porque estamos presentes em mais de 20 países. Temos uma panóplia de pessoas com backgrounds diferentes, o que faz com que necessariamente existam maneiras de estar completamente diferentes, que em termos de liderança também é preciso saber ler, ver quais são as necessidades e descobrir como podemos chegar melhor a essas pessoas.
Acha importante e pertinente existirem este tipo de conferências?
Eu acho que é importante, embora, para mim, o enfoque tenha de ser a pessoa, não necessariamente o género, mas a realidade é que ainda há muito caminho por percorrer e há uma série de estudos feitos, que demonstram que este assunto tem de continuar a ser falado, tem de se continuar a enfocar que estamos numa vertente de mudança de atitude, de comportamento, principalmente, para mim, na desconstrução de preconceitos e daqueles preconceitos que são inconscientes.
Eu lembro-me de há uns 15 anos o meu filho levar lá para casa um amigo, que ficou lá o fim de semana, e eu, no domingo de manhã, peguei no Expresso e comecei a ler a parte de economia. O amigo do meu filho perguntou-me muito admirado se eu lia aquela parte do jornal, porque a mãe dele não lia e ele pensava que as mulheres não liam aquela parte. Esse é um preconceito inconsciente, porque, obviamente, uma criança de 11 anos não tem essa ideia de forma consciente. Mas é preciso contrariar esse tipo de pensamento e isso passa por termos educação e por termos fóruns como este que nos permite dizer “olha, eu não estou de acordo que a liderança é feminina ou masculina, porque para mim a liderança é boa ou má, não depende de géneros, mas vamos falar do assunto”.
Como é que reagiu a este convite?
Eu reajo sempre muito bem aos convites, porque acho que é sempre uma oportunidade para debater estes assuntos, para desmistificar, nomeadamente, a história da liderança ser feminina ou masculina ou, simplesmente, boa. Eu acho que é muito importante nós, na voragem que são os nossos dias, pararmos para pensar nestas questões. A organização estruturada destes eventos permite-nos exatamente isso: parar para pensar. Saímos com novas ideias, com novas questões, com novas certezas e acho que isso nos permite estar noutro ponto: ou evoluímos de uma maneira ou de outra.
Tivemos a oportunidade de assistir a uma das conferências e um dos aspetos principais abordados foi como é que as mulheres conseguem conciliar o aspeto pessoal com o profissional. É possível ser uma mulher de sucesso, no trabalho, ao mesmo tempo que se é uma mulher de sucesso pessoalmente?
Sim, tal como é possível ser um homem de sucesso nesses dois aspetos.
O que pode dizer às mulheres que estão agora a começar em cargos de liderança?
Posso dizer para não terem medo de assumir os desafios. Principalmente, que estejam alerta e saibam perceber onde estão os desafios, que tenham claro, na sua cabeça, que desafios querem aceitar para si mesmas, que não tenham complexos de culpa. Se nós não pusermos na nossa mochila pedras, nem sentimentos de culpa ou de medo, tudo corre bem.
Qual foi a mensagem que deixou na conferência?
A que acabei de passar agora, mas talvez também um desafio que eu acho muito importante. No fundo, cada um de nós faz a diferença. Eu faço a diferença naquilo que faço no dia a dia e gostava que cada pessoa ficasse com vontade de praticar uma ação por dia que permisse substituir estes preconceitos que temos na nossa sociedade e criar mais um elemento positivo na diversidade e na inclusão dos princípios que devem ser aqueles que nos fazem evoluir.