“A FEUC é uma faculdade com um ambiente interno de elevada qualidade”
Recentemente agraciado com duas Medalhas de Mérito Municipal, Álvaro Garrido, historiador económico e professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, instituição onde é docente desde 1995, em conversa com a Revista Business Portugal, perspetiva um futuro “muito positivo” com a renovação de planos de estudo que se projetam num futuro próximo.
Prestes a celebrar 50 anos de existência, quais têm sido os maiores desafios para a Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra?
Os desafios, nos últimos anos, têm sido os da qualificação de uma Faculdade que cresceu muito, na última década e meia, em termos de ensino pós-graduado. Neste momento, quase metade dos nossos estudantes estão inscritos em cursos de pós-graduação. Hoje, a FEUC é uma Faculdade multidisciplinar, cujos estudantes se repartem entre as quatro licenciaturas que oferecemos
(Economia, Gestão, Sociologia e Relações Internacionais) e mais de uma dezena de cursos de mestrado, doutoramento e ainda dois MBA´s e alguns cursos não conferentes de grau. Neste momento, estamos num contexto de reavaliação da oferta letiva e ajustamento de alguns cursos, porque a pandemia provocou uma revolução silenciosa no ensino superior cujos efeitos e exigências importa ponderar. Há uma série de desafios que estão a decorrer e que é preciso considerar devidamente, nomeadamente quanto às metodologias de ensino e à duração e natureza dos cursos de formação avançada.
Para muitos a pandemia foi um recuo no ensino, mas para outros, como a FEUC, foi um momento de descoberta de novos métodos?
A pandemia trouxe duas coisas: se é verdade que os cursos estão acreditados, reconhecidos e planeados para o ensino presencial, ficou claro que há outras formas de ensinar e de conceber o curriculum. A pandemia provocou, também, um sobressalto positivo nas questões da pedagogia universitária, porque obrigou a uma reflexão prática e a uma construção de modelos novos ou renovados. Por outro lado, trouxe algumas dificuldades, nomeadamente o agravamento da questão das desigualdades no acesso ao ensino superior. Trata-se de uma questão estrutural, que nunca esteve resolvida em Portugal, que se revelou com a pandemia e que poderá agravar-se nos próximos tempos. Devemos estar mais atentos aos problemas sociais dos estudantes e dispor de comunidades académicas coesas e bem organizadas para os apoiar numa lógica colaborativa entre as reitorias, as direções das escolas e as associações de estudantes. Na Universidade de Coimbra essa articulação está a funcionar e tem havido sensibilidade para que melhore ainda mais. A FEUC é uma Faculdade que se organiza para servir os estudantes e cujo compromisso com a qualidade de ensino é muito forte. Somos também uma Faculdade com dinâmicas muito fortes de internacionalização em todas as áreas. Nos últimos anos letivos tivemos estudantes de mais de 50 países. É importante consolidar a coesão da escola e enfrentar os desafios do período pós-pandemia.
A FEUC cultiva um projeto de educação pública capaz de equilibrar as vertentes do ensino e investigação. Qual o impacto ao nível da investigação?
No domínio da investigação, houve um impacto negativo, inicialmente, pela exigência que a pandemia criou na criação de métodos de ensino alternativos e adaptação dos docentes. De repente, todos fomos mais professores do que investigadores. Julgo que a produtividade científica dos docentes se sentiu durante alguns meses, mas depois recuperou.
No entanto, em termos de investigação científica houve um facto muito positivo associado à pandemia. A sociedade, em geral, percebeu muito melhor o papel da ciência na sociedade em que vivemos. O papel do discurso científico, o trabalho em equipa na investigação prospetiva e colaborativa relativa às vacinas, foi extraordinário e contribuiu para socializar o papel da ciência em tempos de algum obscurantismo e negacionismo. A Universidade tem um papel civilizador muito importante em relação a isso.
No âmbito do curso MBA para Executivos, a FEUC criou um projeto inovador de forma a reforçar a relação com o tecido empresarial?
O projeto “MBA Consulting” consiste em prestar serviços de consultoria a empresas que queiram participar, de forma voluntária, através dos nossos docentes e estudantes de MBA, que são, na maioria, executivos com experiência de gestão.
A FEUC está a reforçar e aprofundar a relação com as empresas: temos uma rede de parceiros de 64 empresas e entidades que estão protocoladas com a Faculdade; um programa de mentoring e de estágios profissionais, ambos muito ativos. Estamos, também, a iniciar um processo de renovação dos planos de estudo dos cursos de Economia e Gestão. E estamos também a criar uma pós-graduação em Marketing Digital.
Gostaria de salientar que as expectativas do mercado em relação à formação que se obtém na Universidade, é uma questão fundamental. Nesse sentido, na renovação dos planos de estudo, estamos a ouvir empresas para identificar as competências e o perfil de licenciados e mestres que as empresas têm a expectativa de encontrar.
Sendo as universidades um player importante no desenvolvimento do país, têm-se sentido apoiados pelo Governo?
Ultimamente, houve uma maior sensibilidade, por parte do governo, sobre estas matérias, porque as instituições se fizeram ouvir e os estudantes também. Saiu um decreto-lei sobre a questão das prescrições e estabelecendo uma época especial plena, questões de elementar justiça considerando os impactos da pandemia no percurso formativo dos estudantes. Resta apurar qual o benefício que as Universidades e comunidades estudantis vão obter do PRR e parecem-me justas, também, as reivindicações de reforço da ação social escolar.
Em geral, neste momento verifica-se uma ânsia de regresso pleno ao ensino presencial, já em setembro, e há uma boa energia dos estudantes e professores para que tenhamos um ano letivo forte e dinâmico em 2021/22. Há que reconhecer que, apesar de todos os esforços da comunidade académica, os estudantes que tiveram o infortúnio de se matricular na Universidade durante a pandemia tiveram uma experiência empobrecida, quer a nível do conhecimento, quer a nível social e humano. Precisamos de compensar essa perda, acelerando dinâmicas e tendo uma capacidade de oferta e organização de iniciativas de integração mais forte ainda do que era antes da pandemia.
O próximo ano letivo está a ser preparado para um regresso ao ensino presencial?
O nosso desejo é que o próximo ano letivo decorra com a maior normalidade possível, com um ensino presencial sem limitações, mas vamos ser muito sensíveis, naturalmente, ao problema dos estudantes em mobilidade. Vamos admitir alguma flexibilidade nos métodos de ensino para os estudantes que, por razões justificadas e restritas, nomeadamente para os estudantes inseridos em programas de mobilidade Erasmus e outros, que não possam estar presencialmente.
O futuro da Faculdade é muito positivo. A FEUC é uma boa Faculdade, muito organizada e que dispõe de um ambiente interno de elevada qualidade. O que podemos fazer melhor? Podemos e devemos antecipar o futuro, renovando alguns planos de estudo e reforçando as relações com a comunidade.