Teresa Ponce de Leão: Liderança e Inteligência emocional

Numa entrevista exclusiva, Teresa Ponce de Leão, Presidente do LNEG, dá a conhecer a sua essência e o universo do Laboratório Nacional de Energia e Geologia.

 

Teresa Ponce de Leão, Presidente

 

 

O mote para esta edição é o Mês da Mulher. Neste enquadramento, e enquanto mulher líder, o que a inspira e motiva diariamente? Como consegue criar um equilíbrio entre a esfera pessoal, social e profissional?

Os meus maiores desafios foram – e são – mudar mentalidades, explicar e aplicar o princípio de que tudo se gere e estabelecer prioridades. Em tudo temos de ser eficazes, eficientes e capazes de medir os impactos dos investimentos, sejam eles na produção de ciência ou na gestão do dia-a-dia. Creio que também fui sempre muito consciente das minhas capacidades, pontos fortes e pontos menos fortes. A colaboração e a partilha são igualmente fundamentais em todas as esferas da vida e têm sido alicerces que sempre me ajudaram a lutar pelo êxito e pela melhoria contínua e sinto que ainda há muito por fazer. É precisamente este meu lado de insatisfeita que não me deixa acomodar.

Quais foram os momentos decisivos que moldaram o seu percurso? Que princípios ou valores fundamentais segue na sua jornada como presidente do LNEG?

A dada altura de um percurso de vida é preciso fazer escolhas e tomei a decisão de assumir funções de dirigente de um instituto público, em detrimento de uma carreira académica. Procuro trabalhar com pares internacionais e colaboro em inúmeros grupos de trabalho, principalmente europeus, tomando neles parte de forma muito activa. Mantive sempre esta proactividade na procura de relações internacionais, que me permitiu ter uma visão do mundo segundo diferentes perspectivas e tomar conhecimento das melhores práticas. Como presidente, gostaria de ter condições para premiar o mérito, porque tenho a plena consciência de que, no LNEG, o sucesso é da equipa.

Como descreve a sua visão de liderança e como ela se reflete na sua gestão no LNEG? Quais são os principais desafios que enfrentou como líder do LNEG e como os superou? E quais as principais conquistas alcançadas?

Após a tomada de decisão do Governo, de então, sobre a extinção do INETI e a transferência das competências em energia e tecnologia para o novo instituto com funções de Laboratório do Estado nas áreas de Energia e Geologia, surgiu o LNEG. Atendendo às competências científicas e ao histórico das actividades de investigação, a estratégia seguida foi centralizar a actividade nas energias renováveis, na eficiência energética, na economia circular e na geologia, mantendo o LNEG as funções de Serviço Geológico Nacional. Enquadramos a actividade na nossa qualidade de “Research and Technology Operator” o que significa que se faz investigação para acumulação de conhecimento e posterior transferência para a sociedade.

A transição foi exigente a vários níveis e à reorganização interna do sector científico seguiu-se uma reorganização administrativa, com a simplificação e centralização de procedimentos e proporcionando ao sector de investigação um apoio administrativo mais ágil e eficiente. Apostámos na digitalização e na internacionalização e, hoje, somos membros com funções executivas em importantes redes europeias, como na “European Energy Research Alliance” (a maior aliança europeia para a investigação em energia e de que também somos fundadores), na “European Sustainable Energy Innovation Alliance” e nos EuroGeoSurveys. O reconhecimento pelos pares foi sempre uma motivação enquanto medida de avaliação do nosso desempenho. Sempre tive a consciência de que não temos resultados se nos mantivermos isolados. Como referi anteriormente, no LNEG, o sucesso é da equipa e da capacidade de termos uma boa rede de colaborações, a nível nacional e internacional.

O LNEG tem vindo a dirigir estrategicamente a sua actividade para as orientações políticas do país e da Europa. Consideramos como grandes desafios a promoção da desmaterialização e a flexibilidade interna, multidisciplinar que garanta qualidade nas respostas, mas também agilidade e adaptação. Cativar as pessoas, os nossos investigadores, para essa permanente adaptação tem sido uma preocupação permanente. Não podemos ser acomodados, temos de cultivar uma inquietude e tentar fazer melhor, e mais, tendo em conta as necessidades e o que o país espera de nós.

Com os olhos postos no futuro, qual a visão estratégica delineada para o LNEG? Que iniciativas ou projetos estão programados para continuar a avançar nas áreas da Energia e Geologia e fazer, cada vez mais, do LNEG uma instituição de referência capaz de contribuir com soluções de excelência para uma economia descarbonizada?

A tomada de decisão deve ser baseada no conhecimento científico. “Construir um futuro mais limpo e melhor”, é o nosso lema, e contribuímos de forma independente para o desenvolvimento económico e melhoria da qualidade de vida, colocando o conhecimento ao serviço da sociedade. Trabalhamos em duas áreas de referência: energia e geologia e somos um “Research and Technology Operator”, que investiga e desenvolve conhecimento com uma estratégia clara: aplicar esse conhecimento para uma economia verde. Assim, colaboramos com o sector empresarial e no apoio às políticas públicas. Saliento projectos já terminados, mas importantes, como o CAVALI na Cadeia de valor do Lítio, que deu um contributo importante para a utilização de métodos físicos no processamento de minérios de Lítio ou o Edifício Solar XXI que representa um marco histórico, pois foi o primeiro Edifício NZEB (“Net Zero Energy Building”) em Portugal, ainda antes da Directiva Europeia EPBD e foi pioneiro na construção e na integração das Energias Renováveis na própria arquitectura do edifício. Também o Projecto FRAME – “Forecasting and assessing europe’s strategic raw materials needs”, que expandiu o conhecimento dos recursos minerais estratégicos e de matérias-primas críticas através da compilação do potencial mineral e áreas metalogénicas focada nas associações metálicas interrelacionadas em terra e no mar, o projecto CIRCO Hub Portugal, cujo objetivo principal é incentivar a economia circular através do design, o projeto eMaPriCE, desenvolvido para a APA, que visa identificar oportunidades de implementação de estratégias de Economia Circular a fim de evitar que as Matérias-Primas Críticas (MPC) se transformem em resíduos, bem como apresentar opções da substituição destas por matérias-primas não críticas, o  projecto geoON – Atividade Geológica e Mineira Online, que visou a digitalização do acervo de dados do LNEG através do tratamento e harmonização de informação geocientífica recolhida por nós na área da Geologia e Minas, para disponibilização aberta no geoPortal da Energia e Geologia, alinhada com Directivas de dados europeias e nacionais, e melhorámos tecnologicamente o geoPortal ao nível da acessibilidade, usabilidade e segurança.

Mais actuais e, com os olhos no futuro, refiro o projecto “START” que visa criar um sistema sustentável de captura de energia através de uma abordagem inovadora de reciclagem de resíduos de mina, o H2Driven, uma proposta de implementação e valorização de uma nova cadeia de valor na área dos e-combustíveis verdes em Portugal e o Projecto “CO2nstruct – “Modelling the role of circular economy construction value chains for a carbon-neutral Europe”, para citar apenas alguns. Ainda de referir a elaboração do Atlas para o Hidrogénio.

Finalmente, gostaria de referir – até porque foi publicada hoje, precisamente, em Diário da República a Resolução do Conselho de Ministros (RCM nº41/2024) que o aprova – o Plano de Acção para o Biometano, desenvolvido pelo LNEG e que cria um grupo de acompanhamento cuja coordenação nos foi atribuída.

 

Março é considerado o mês da Mulher e da luta pela igualdade de direitos entre géneros, nas organizações e na sociedade em geral. Que palavras gostaria de deixar a todas as mulheres líderes ou que aspiram a liderança, nomeadamente na área da Ciência e Tecnologia?

Abracem a mudança com coragem e dedicação. Muito trabalho e inteligência emocional e sem ter medo de decidir. E não esquecer que, por vezes, é preciso ter a audácia de arriscar.

 

NOTA: por indicações da autora, este artigo não foi escrito ao abrigo do acordo ortográfico vigente.

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