Onde estão os líderes que verdadeiramente nos inspiram?

Nasci em 1978 e cresci rodeado de referências globais que, mesmo à distância de um ecrã ou de uma página de jornal, exerciam uma influência profunda sobre a forma como via o mundo. Eram líderes com falhas, é certo — como todos nós —, mas havia neles algo de maior, de mais nobre: uma missão clara, um sentido de serviço, um compromisso inabalável com a justiça, com a paz, com a dignidade humana.

 

 

Ricardo Costa, Chairman do Grupo Bernardo da Costa

 

 

Recordo o olhar sereno e firme do Dalai Lama, a voz conciliadora e determinada de Nelson Mandela, a coragem estratégica de Mikhail Gorbatchov ao abrir caminho para o fim da Guerra Fria. Lembro-me da tenacidade de Helmut Kohl na reunificação alemã, da luz silenciosa e incansável de Madre Teresa de Calcutá entre os mais pobres dos pobres, e da diplomacia serena de Kofi Annan, um verdadeiro construtor de pontes num mundo muitas vezes em ruínas. Todos diferentes, mas unidos por um traço comum: inspiravam. E inspiravam genuinamente.

Hoje, olho em volta e pergunto-me: onde estão esses líderes? O mundo atual está cheio de chefes de Estado, gestores de poder, influenciadores, figuras mediáticas… mas vazios de verdadeiros líderes. A diferença é abismal. Liderar não é mandar. Não é ocupar um cargo. Não é discursar com mestria. Liderar é servir. É mobilizar. É ter a coragem de tomar decisões difíceis, mas justas. É colocar o bem comum acima do interesse pessoal ou político. É ter um propósito maior do que a própria ambição.

Estamos a viver uma profunda crise de liderança global. As grandes questões do nosso tempo — das alterações climáticas à desigualdade social, da guerra à crise de valores — exigem líderes com visão, empatia e sentido de missão. E, no entanto, o que temos são, na maioria das vezes, protagonistas de curto prazo, reféns de ciclos eleitorais, das redes sociais, do ruído constante, do ego inflamado.

É por isso que a morte do Papa Francisco, que considero ter sido o último verdadeiro líder global com dimensão moral e humanista, deixou um vazio imenso. Não apenas para os católicos — embora muitos tenham perdido o seu pastor — mas para o mundo em geral, que ficou mais pobre de uma referência ética, de uma voz serena no meio do caos, de um exemplo vivo de coerência, humildade e coragem.

Francisco era, em muitos aspetos, herdeiro dos gigantes que marcaram as décadas de 80 e 90. Era capaz de escutar os que ninguém ouvia, de se aproximar dos que todos evitavam, de dizer verdades incômodas com ternura e firmeza. Num tempo em que a linguagem da política se tornou fria e calculista, ele falava ao coração. E por isso tocava tantos — crentes e não crentes.

O seu desaparecimento físico é mais do que a perda de um homem. É o fim de uma era. Uma era em que, mesmo em tempos difíceis, sabíamos onde procurar inspiração. Sabíamos a quem recorrer quando tudo parecia desabar.

Hoje, resta-nos a inquietação. A pergunta que não quer calar: onde estão os líderes que verdadeiramente nos inspiram?

Talvez esta ausência nos deva provocar. Talvez seja ela a chamar-nos a uma responsabilidade maior. Talvez o tempo de esperar por salvadores tenha passado. Talvez o mundo precise, mais do que nunca, de pequenas lideranças com grande caráter.

Porque o verdadeiro legado de Francisco, de Mandela, de Teresa, de Annan, de tantos outros… não é apenas o que fizeram. É o que nos deixam como desafio: que sejamos nós, cada um à sua escala, a liderança que o mundo precisa.

Mas, confesso… cresci com gigantes. E tenho saudades deles.

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