ANAGREI: O vazio legislativo que urge suprir

Não é invulgar apercebermo-nos de que a legislação carece em certos assuntos, prejudicando empresas e sua clientela. A área de alugadores de equipamentos industriais padece dessa problemática: há falta de legislação concreta para a circulação de gruas de 60 ou mais toneladas nas vias públicas. A alternativa passa por pedir uma licença para circular dentro de um determinado percurso e aguardar entre três a seis meses para que esta seja concedida.

Aqui somos confrontados com o cerne da questão: “É inaceitável que as empresas deste setor respeitem todas as regras de circulação, manutenção e manuseamento destes veículos, mas não existe legislação que lhes permitam circular na via pública dentro de prazos aceitáveis”, afirma-nos Maria João Frade. A presidente da Associação Nacional de Alugadores de Equipamentos Industriais (ANAGREI) dá voz à aflição vivida diariamente pelas empresas deste setor.

A autorização requerida demora meses a chegar – três, seis ou até nove meses. Partindo do princípio de que é aprovada, as empresas ficam, assim, com trinta dias para proceder à deslocação da grua até ao destino. E, até há bem pouco tempo, eram obrigados a efetuar outro pedido de autorização para deslocar a máquina novamente para a empresa sua detentora. A licença representa em si mesma um gasto que é, apesar de tudo, bastante inferior ao prejuízo que causa às empresas pela demora em chegar. As entidades veem-se impedidas de garantir prazos aos clientes, uma vez que se encontram constantemente dependentes do tempo que demora a emissão das licenças. Situações há nas quais é possível antecipar e programar todo o processo, porém “na maioria das vezes é impossível prever que máquina vai ser necessária e em que local”.

Se toda esta realidade é difícil de aceitar, há situações “gritantes”, como afirma a nossa interlocutora: “Para várias deslocações no mesmo mês, para o mesmo local e exatamente o mesmo trajeto, pode ser necessário duas autorizações simplesmente devido ao prazo de 30 dias que, entretanto, termina”.

Atualmente, as licenças já preveem o regresso da grua ao estaleiro, facto que não acontecia anteriormente. No entanto, “pode simplesmente ser-nos mais conveniente que o regresso seja feito para um estaleiro diferente do da partida. Ora, nesse caso, temos de solicitar outra licença só de regresso, para deslocar a grua para um local diferente do original”.

Delegação de responsabilidades

As licenças são requeridas ao Instituto da Mobilidade Terrestre (IMT) que, por sua vez, as transmite às Infraestruturas de Portugal (IP), que solicita autorização de viabilidade de trajeto às várias concessionárias dentro do percurso que se pretende fazer. A resposta vem no sentido inverso: das concessionárias para as IP, das IP para o IMT, o qual transmite o parecer final. “Estas formalidades e burocracias atrasam o nosso trabalho e o desenvolvimento das indústrias que dependem das nossas gruas para trabalhar”, expõe a presidente da ANAGREI.

Questionamos se haveria forma de agilizar este processo. Maria João Frade acredita que sim: “Vou dar como exemplo os vizinhos espanhóis que emitem uma licença para quatro anos, que permite a deslocação das gruas dentro de determinados horários e trajetos. Através de um site é possível monitorizar em tempo real se a estrada está ou não transitável e quais são as alternativas. Este é um excelente exemplo e que pode ser facilmente replicado em Portugal, dando-nos, desta forma, autonomia e responsabilidade na deslocação das gruas e possibilitava agilizar os trabalhos mais urgentes ou de emergência”.

Os organismos responsáveis poderão delegar responsabilidades nas empresas em questão como forma de acelerar todo este processo. “Hoje em dia, com a disponibilidade de informação e a facilidade que existe em consultar as condições das vias” já não é compreensível o tempo perdido.

Imprevistos

Estas máquinas de grande dimensão são solicitadas, com frequência, para a indústria pesada ou para o setor da energia eólica. A montagem de um parque eólico, por exemplo, é planeada, mas uma avaria numa torre não o é, quando isso acontece “temos de aguardar entre três a seis meses para que a grua tenha autorização para ser deslocada para o local”.

O que se verifica em caso de avaria também ocorre em caso de acidente: “Por norma, não trabalhamos diretamente com o Governo, mas, mesmo assim, há acontecimentos que podem suceder, como um acidente numa ferrovia ou a queda de uma ponte, que exija a intervenção imediata de uma grua e que não estão devidamente acautelados. Outra situação que estamos sujeitos é que, durante a deslocação, ocorra um acidente com o nosso próprio equipamento e não podemos solucionar com celeridade, nem enviar outra máquina no seu lugar. Não podemos garantir prazos de reparação ou manutenção”.

“Defendo que deveríamos ter uma autorização especial, emitida para todas as empresas de gruas em Portugal, para circular dentro de determinados trajetos, em determinados horários. Admito que sejam impostas restrições quanto às estradas a serem utilizadas, horários nos quais a circulação é permitida e outras medidas que entendam ser pertinentes. Entendo, também, que os transportes especiais não devem interromper a circulação normal e diária, por isso é que na maioria das vezes é efetuado durante a noite. Tudo isto é aceitável, exceto o facto de estas máquinas serem construídas e utilizadas no mundo inteiro e só em Portugal é que não há autorização para circular na via pública”.

A verdade é que estes equipamentos são, de facto, extremamente pesados. Posto isto, outra verdade é que são construídos de forma a poderem circular na estrada sem danificar nenhuma das partes. “Quando me refiro a uma grua de quinhentas toneladas a generalidade das pessoas fica assustada, mas a máquina em si não pesa quinhentas toneladas, isso não implica que a grua tenha de circular na via pública com todo este peso, porque parte dele são acessórios desmontáveis que são transportados noutros veículos, nomeadamente em camiões”, esclarece-nos Maria João Frade, que acrescenta: “O facto de circularem na via pública requer bastante cuidado e estudos prévios do percurso, para não corrermos o risco de danificar as máquinas e optamos por estradas ou circuitos já percorridos de forma a evitar imprevistos. Também é do nosso interesse que a estrada tenha condições para a circulação”.

Quebrar mitos

‘Gruas de 750 toneladas’: eis uma frase que pode impressionar. O que a generalidade das pessoas não sabe é que esse peso se refere à capacidade de movimentação da máquina, ou seja, o quanto o equipamento consegue levantar. “Nas gruas, a referência de tonelagem corresponde ao peso que esta é capaz de levantar se a carga estiver junto à própria máquina, algo que por motivos práticos nunca acontece. À medida que aumenta a distância entre carga e grua, a capacidade desta última vai diminuindo. Ou seja, às vezes para movimentar uma peça de dez toneladas pode ser necessária a máquina de 300 toneladas, porque depende dos raios (distância entre a carga e a grua)”.

São instrumentos operados por profissionais com vários anos de experiência e formação extensa para cada equipamento, muitas vezes fornecida pela própria marca que o concebe, por forma a garantir a “máxima segurança e responsabilidade”, assegura a presidente da ANAGREI.

ANAGREI: Associação Nacional de Alugadores de Equipamentos Industriais

Maria João Frade, presidente

A Associação Nacional de Alugadores de Equipamentos Industriais (ANAGREI) nasceu há mais de 25 anos (1991) em prol da defesa dos interesses dos profissionais e empresas deste setor. A sua fundação “era uma necessidade que todos os alugadores tinham, porque os problemas existentes eram comuns a todas as empresas” e entenderam que seria em benefício de todos constituir uma associação que os defendesse, refere-nos Maria João Frade, presidente a cumprir o segundo mandato.

A ANAGREI representa, atualmente, 21 empresas organizadas em três divisões de aluguer: auto gruas, gruas torre e auto montantes e outros equipamentos. “Temos outro tipo de associados que nós consideramos membros: empresas que representam em Portugal as marcas com que trabalhamos”, acrescenta.

As empresas associadas da ANAGREI representam um volume de negócios que ronda os 300 milhões de euros por ano, empregam cerca de dois mil trabalhadores e dispõem de um parque de máquinas e equipamentos de mais de cinco mil unidades, com um valor de aquisição superior a 500 milhões de euros.

Fazer parte desta organização significa reger-se pelos mais altos códigos de conduta e com a obrigação expressa de oferecer um serviço de qualidade. Isto é uma garantia acrescida de que o cliente que aluga uma máquina de um destes associados pode ter a certeza de que terá um bom serviço.

“A missão é que a nossa atividade seja reconhecida como complementar às outras atividades que existem no país e que tudo o que fazemos seja legalizado”. Atualmente, a maior luta da ANAGREI é, tal como explicado nestas páginas, a problemática da falta de licenciamentos céleres para a circulação de gruas de 60 toneladas ou mais nas vias públicas. “Queremos operar na legalidade e ter as mesmas condições que se verificam noutros países. A associação tem tido um papel relevante no sentido da problemática das licenças, falta a disponibilidade política para que isso aconteça”, conclui Maria João Frade.

 

Em defesa da simplificação do setor

Constituída no início dos anos noventa, a ANAGREI tem como principal missão a dignificação da atividade, a defesa e estabelecimento de procedimentos de segurança, a certificação da operacionalidade dos equipamentos e a qualificação profissional dos trabalhadores ao serviço dos associados. Em entrevista à revista Business Portugal, Fernando Pinheiro, presidente da assembleia geral, refere a necessidade de uma tomada de posição por parte dos partidos políticos, com vista à proteção e incrementação do setor em Portugal.

 

Fundada em 1991, a ANAGREI representa as empresas do setor de aluguer, em três áreas distintas: auto gruas, gruas torre e auto montantes e outros equipamentos.

Oferecer um serviço de qualidade, dinamizando a relação comercial e operacional com os clientes, através de um conjunto de estratégias de melhoramento do mercado é o principal propósito desta associação, que abarca 21 empresas, as quais representam um total de 2000 trabalhadores.

Neste contexto, torna-se premente a luta da associação junto das entidades partidárias para o melhoramento das condições do setor, como nos explica Fernando Pinheiro: “A atividade de aluguer de máquinas e equipamentos industriais atravessa uma conjuntura particularmente complicada. Por isso mesmo, procuramos junto dos poderes públicos uma colaboração, no sentido de melhorar as práticas burocráticas excessivas que se processam desde finais da década de 90, nomeadamente na ótica da licença de circulação e da matriculação de equipamentos”.

Durante este período já foram várias as solicitações da ANAGREI junto dos grupos parlamentares, mais propriamente PCP, BE, PS e PSD, que acabaram por não surtir qualquer efeito relativamente às pretensões da associação. “Periodicamente existem reuniões do regulamento de autorizações especiais de trânsito, e é nesta vertente que são necessárias mudanças à legislação em vigor. Não podemos aceitar que as licenças de autorização demorem mais de dois meses a serem emitidas e só tenham valor por um período de 30 dias. Enquanto, no país vizinho, as mesmas empresas conseguem licenças em apenas 10 dias, por uma validade nunca inferior a quatro anos”, sublinha o presidente da assembleia geral. Um problema recorrente que sucede devido à morosidade das diferentes entidades públicas que têm de avaliar este processo de autorização, nomeadamente o IMT – Instituto de Mobilidade e Transportes e a IP – Infraestruturas de Portugal. “Falámos de processos burocráticos complexos, da nossa inteira responsabilidade, que têm prejudicado fortemente a dinâmica económica das empresas”, completa.

Por isso mesmo, a ANAGREI irá continuar a focar a sua luta na mudança de paradigma, de forma a mudar a maneira como as entidades públicas olham e tratam o setor de aluguer de equipamentos industriais em Portugal.

 

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