Aposta no progresso e na evolução da carreira profissional
A Associação Portuguesa de Higienistas Orais (APHO) centra a sua atividade essencialmente na valorização da profissão, defendendo os direitos e deveres dos profissionais e na melhoria dos cuidados de saúde pública. Em entrevista à Revista Business Portugal, Fátima Duarte, Presidente, traça um balanço da ação da associação, avalia o presente e antevê o futuro da saúde oral em Portugal.
A APHO ao longo dos seus 30 anos de existência, tem vindo a crescer em número de associados e em importância, definindo padrões de excelência e despertando na sociedade hábitos de prevenção. Que balanço traça da ação da APHO?
O balanço é muito positivo. De facto, quando iniciámos, mais precisamente há 32 anos, eramos muito poucos, a profissão era nova em Portugal e a representação social da profissão era (quase) inexistente. Hoje podemos afirmar que essa representação tem uma relevância muito maior, quer junto aos parceiros diretos da classe profissional, quer ao nível da população em geral. O crescimento da afirmação a nível internacional também é uma realidade, fruto da nossa pertença às Federações Europeia e Internacional de Higiene Oral. Portugal é um dos países de referência em termos de formação, e o único país do mundo a oferecer um programa de doutoramento na área específica de Higiene Oral. E este reconhecimento muito se deve aos esforços que todos os dirigentes que passaram pela APHO ao longo destes anos, e muito claramente aos profissionais que têm trabalhado para elevar e dignificar a profissão. Mas há ainda um caminho muito longo a percorrer. É necessário investir mais e melhor para tornar os higienistas orais cada vez mais presentes a nível do setor privado, no 3º setor e SNS, com abordagens individuais e também a nível comunitário, integrados em equipas multidisciplinares, em prol da saúde oral dos portugueses.
Qual a estratégia definida para a concretização dos vossos desideratos? A formação contínua é um dos vossos pilares para dotar os profissionais de conhecimentos e competências atualizados?
O amplo espectro de ação junto, nomeadamente, da tutela, dos sindicatos do sector, do Fórum das Tecnologias da Saúde, de organismos nacionais e europeus, visa a defesa dos direitos e deveres dos profissionais e da saúde pública.
Procuramos manter uma estratégia de comunicação aberta, pró-activa e activa, antecipando e respondendo aos múltiplos desafios que nos vão sendo apresentados por todos os stakeholders com quem nos relacionamos.
A atualização e aquisição de conhecimentos e a valorização dos nossos associados através da formação contínua é uma das principais missões da APHO. Realizamos anualmente, o nosso congresso e a reunião científica com a SPEMD (Sociedade Portuguesa de Estomatologia e Medicina Dentária) e ainda diferentes formações específicas, orientadas para ajudar o Higienista Oral no seu dia a dia. As parcerias criadas com a Indústria proporcionam cursos, criando valor em termos de condições preferenciais (atualmente mais em formato on-line) para os nossos associados.
As temáticas abordadas variam e dependem dos interesses dos associados, assumindo um caráter de inovação, divulgação de orientações e guidelines, de encontro ao que se identifica de forma mais recente de boas práticas, do ponto de vista clínico e científico.
Como analisa o contributo dos higienistas orais no Serviço Nacional de Saúde (SNS) e no setor privado?
O contributo dos higienistas orais no SNS é inequívoco. Os dados dos estudos epidemiológicos nacionais confirmam que nos locais onde existem higienistas orais integrados no SNS os indicadores de saúde oral são melhores. Isto orgulha-nos! No entanto, somos ainda muito poucos para as necessidades e procura existentes. A área de abrangência e a potencial ação do HO com outros grupos populacionais deve ser muito mais vasta, com grávidas, idosos, pessoas com necessidades especiais, pacientes com doenças crónicas, entre outros. Pelo seu papel primordial na prevenção da doença e promoção da saúde oral e geral a aposta das políticas públicas deveria ser mais focada nos higienistas orais, pois é a estratégia que cria mais valor, traz mais ganhos levando a menos iniquidades em saúde. A nível do sector privado, os Higienistas Orais têm que ser considerados como membros imprescindíveis da equipa de saúde oral, cujo papel será criar e facilitar as melhores condições para que os seus pacientes adquiram e mantenham hábitos de saúde oral adequados, e trabalhar em parceria com médico-dentista ou estomatologista na manutenção dos tratamentos efetuados. Só assim se conseguirá obter melhores resultados em termos de saúde oral e saúde no geral.
O estudo Global Burden of Disease mostrou que a saúde oral em todo o mundo não melhorou significativamente nas últimas três décadas e que continua a ser um grande desafio para a saúde pública global. Chegou pois a hora de desenvolver uma nova abordagem para promover a saúde oral. Aquela que considera a saúde oral como uma parte inequivocamente integrante da saúde geral e que responde às necessidades das populações e inclui uma abordagem integrada de saúde pública para combater os determinantes sociais das doenças crónicas, aliás os mesmos das “nossas” doenças crónicas, as mais prevalentes, a cárie dentária e doença periodontal. E, é claro o screening e diagnóstico precoce do cancro oral. O foco na prevenção promoverá a saúde oral da população e reduzirá a carga sobre os serviços curativos de inúmeros casos de doença oral, gerando melhores ganhos em saúde (oral e geral) da população a custos mais baixos.
Em Portugal, essa é a grande carência: literacia, acesso ao sistema, higiene oral, avaliação do risco de cada paciente, e prevenção, prevenção…
Os cidadãos precisam de ter acesso efetivo à prevenção na saúde oral. Um cheque higienista oral para assegurar que ninguém fica excluído ou desinformado neste processo.
Que avaliação faz do presente e como antevê o futuro da saúde oral em Portugal, no contexto da pandemia e do pós-pandemia?
O impacto da Covid-19 na saúde oral pode ser complexo e extenso. Desde logo, pela progressiva afetação do acesso aos cuidados de saúde oral. A crise económica que infelizmente acompanha a crise sanitária, torna ainda mais difícil a acessibilidade, sobretudo para grupos populacionais mais desfavorecidos, e até das classes médias, exacerbando as desigualdades já sentidas em período pré-pandémico. O acesso também pode ser prejudicado por ansiedade associada à (não)segurança e de infeção Covid-19. As mudanças nos comportamentos de saúde em resposta à COVID-19 estão já francamente documentadas, como os aumentos relatados no consumo de álcool e tabaco, afetação de atividade física regular e problemas de saúde mental: todos eles fatores de risco que afetam a saúde oral.
Claramente que maiores esforços e abordagens diferentes são necessários para promover a saúde oral global. Há um consenso ao nível da OMS e organismos internacionais sobre os benefícios decorrentes da integração da saúde oral nos cuidados de saúde primários. É a abordagem defendida de Cobertura Universal de Saúde (UHC). A reafectação de higienistas orais no apoio aos serviços de saúde pública durante a crise foi mais um passo para a integração dos cuidados de saúde oral e geral e demonstrou a versatilidade, adaptabilidade, resiliência e o espírito de equipa dos Higienistas Orais.
A principal lição oferecida pela pandemia Covid-19 foi que, esforços combinados são cruciais para abordar uma pandemia com sucesso. Da mesma forma, esforços concertados são necessários para controlar o impacto da saúde oral na saúde dos indivíduos e populações, abordando as falhas dos sistemas de saúde oral. A promoção de valores de justiça social e a redução das iniquidades em saúde oral devem ser centrais a qualquer nova abordagem.
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