Desmistificação da sexualidade

A Sociedade Portuguesa de Sexologia Clínica (SPSC) destaca-se pela sua abordagem flexível e assertiva à formação e sensibilização em sexologia clínica. Em entrevista, a Presidente da SPSC, Joana Carvalho, defende a importância de combater a falta de literacia sexual e promover a saúde sexual e reprodutiva, através da educação, da ciência e da ação cívica.

 

 

 

Como é que a empatia e a flexibilidade, características frequentemente associadas à liderança feminina, influenciam a abordagem da SPSC à formação e sensibilização em sexologia clínica, num contexto onde a sexualidade ainda é um tema tabu?

A sexualidade é uma importante faceta das relações humanas. A sua representação existe muito antes de existir a escrita. Sendo tão natural, a sexualidade foi, e é, amplamente politizada e usada como matriz de controlo social. Mais do que tabu, é um instrumento com o qual as sociedades definem as suas liberdades. É neste contexto que a flexibilidade é um valor fundamental na forma como a SPSC opera, seja através do seu curso, Curso de Especialização em Sexologia Clínica, ou ações de consciencialização social. Sabemos que a população mundial, independentemente da sua escolaridade, carece de literacia sexual, perpetuando mitos que, sem fundamento científico, promovem a discriminação e são a principal barreira à promoção da saúde sexual e reprodutiva ou à prevenção de todas as formas de violência sexual e de género. Mais do que a empatia, diria que o equilíbrio entre a assertividade, a flexibilidade e a coragem com que contornamos barreiras ideológicas, são valores fundamentais com os quais a SPSC cumpre a missão de salvaguardar Direitos Humanos por via da educação, da ciência e da ação cívica.

Quais foram os maiores desafios que enfrentou enquanto mulher em cargos de direção? Como esses desafios moldaram a sua visão sobre a liderança e a resiliência no campo da sexologia?

A ausência de modelos de liderança e visibilidade feminina foi o principal desafio. Foi preciso construir um espaço psicológico onde desenhei e segui o meu percurso profissional em áreas onde nenhum nome de revelo era o nome de uma mulher (e.g., área da agressão e compulsividade sexual) e onde assumi a responsabilidade de ser exemplo para outras jovens mulheres. Quer queiramos, ou não, somos exemplo. Este exemplo afirmativo é uma fonte importante de conforto, incentivo e segurança. No confronto científico e de tomada de decisão, as mulheres debatem com grupos legitimados pela história e não apenas pela meritocracia. Na SPSC, em 16 mandatos, 8 foram presididos por mulheres. Isto não acontece noutras congéneres onde a ausência gera mais ausência, minimizando o potencial de muitas gerações de mulheres.

Como Presidente da SPSC, que iniciativas ou projetos tem em mente para inspirar a próxima geração de líderes femininas na área da sexologia? Que impacto espera que essas iniciativas tenham na sociedade portuguesa em geral?

Na SPSC há uma prevalência de mulheres nos corpos de gestão, que aqui cumprem o seu potencial, e fazem caminho para fomentar as suas carreiras pessoais. Há um particular investimento em mulheres em início de carreira, onde, frequentemente, escasseiam oportunidades de incremento curricular. À SPSC dão valor, às outras mulheres, dão exemplo e segurança. É também feito um trabalho de promoção da visibilidade de pessoas jovens (não apenas mulheres) através, por exemplo, da Galeria de Jovens Investigador@s, para valorizar quem ainda tem todos os desafios pela frente. Esta iniciativa vai estender-se a jovens que tenham feito projetos de intervenção social, em questões como educação para a sexualidade, Direitos Sexuais ou promoção da saúde sexual. A SPSC trabalha desde 1985 e formou dezenas de profissionais que todos os dias materializam a nossa missão e valores. Portugal foi o primeiro país do mundo a reconhecer formalmente o Dia Nacional da Saúde Sexual. Portanto, tivemos impacto. Importa continuar, conscientes que o nosso direito à igualdade e saúde sexual é reconhecido, mas nunca garantido.

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