CPLP: Idioma comum, com laços históricos e culturais

“A CPLP representa, hoje, cerca de 300 milhões de cidadãos de nove Estados, distribuídos em quatro continentes e inseridos, cada um, em  contextos regionais específicos. Trata-se, assim, de uma organização de grande potencial estratégico, político e económico”. Maria do Carmo Silveira, Secretária Executiva, faz o balanço do seu mandato que termina este ano.

 

Como é que viu a sua candidatura ao cargo de Secretária Executiva da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa e que sentimento a envolveu quando foi eleita?

Foi para mim uma grande honra ter sido escolhida pelo governo do meu país, São Tomé e Príncipe, como a candidata santomense ao cargo de Secretária Executiva da CPLP. Ao ver essa candidatura acolhida e endossada pelos demais Estados-Membros da organização por ocasião da Cimeira de Brasília, em 31 de outubro de 2016, senti ao mesmo tempo orgulho pela oportunidade de servir o meu país numa nova frente e o peso da responsabilidade que o cargo traz consigo. Foi certamente um momento bastante especial na minha trajetória pessoal e profissional.

 

Foi Primeira-Ministra, Ministra do Plano e Finanças e Governadora do Banco Central de São Tomé e Príncipe. Sente que este era um desafio que lhe faltava? Este percurso assumiu-se uma mais-valia para o desempenho das suas funções? Porquê?

Foi, sem dúvida, uma oportunidade de crescimento e de desenvolvimento pessoal. Já representei São Tomé e Príncipe em foruns internacionais, especialmente no Banco Mundial e no FMI. Contudo, ocupar a cadeira de Estado-Membro e a de Secretária Executiva constituem, sem dúvidas, experiências bem distintas, pois as minhas intervenções passaram a ter em conta a necessidade de consensos com base no interesse comum de todos os Estados-Membros, e não apenas na defesa de uma perspetiva nacional. Nesse sentido, vi-me obrigada a sair de uma zona de conforto a que já estava habituada, o que é sempre enriquecedor e estimulante. Além disso, saí de uma experiência mais concentrada em temas financeiros e económicos para lidar com uma miríade de ‘dossiers’ relacionados com a concertação político-diplomática, com a cooperação nas mais diversas áreas e com assuntos ligados à língua portuguesa e à cultura. Foi um período de grande aprendizagem e uma experiência ímpar.

 

Em final de mandato, que balanço é possível perpetuar deste período? Quais foram as principais conquistas? Que cunho tem procurado deixar nesta entidade?

 

Foram dois anos de intenso trabalho e bastante desafiantes. Tive a oportunidade de visitar quase todos os nossos Estados-Membros e de dialogar com autoridades governamentais e membros da sociedade civil, e entrar em contato com diferentes visões e perspetivas sobre o papel a ser desempenhado pela CPLP. O meu mandato coincidiu com a presidência pro-tempore do Brasil, que elegeu como tema ‘A CPLP e Agenda 2030 para o Desenvolvimento’. Nesse sentido, trabalhamos para incorporar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável estabelecidos pela Agenda 2030 das Nações Unidas nas estratégias e programas de cooperação da CPLP, de modo a fazê-los convergir com a agenda global de cooperação. O meu mandato coincidiu, também, com o início da implementação da Nova Visão Estratégica para a CPLP para o decénio 2016-2026, adotada pela Cimeira de Brasília, no final de 2016, na mesma ocasião em que fui eleita como Secretária Executiva. No seguimento da adoção da Nova Visão Estratégica, coordenei no primeiro semestre de 2017 a elaboração de um documento de operacionalização desta Nova Visão, que traduz em iniciativas e ações as diretrizes e orientações estabelecidas pelos Chefes de Estado e de Governo da Comunidade. Esse segundo documento proporcionou à CPLP, em geral, e ao Secretariado Executivo, em particular, um mapa e um enquadramento para o planeamento, a implementação e o acompanhamento das suas atividades. Paralelamente, pudemos dar um contributo importante à visibilidade da CPLP levando a nossa organização para grandes palcos regionais e internacionais onde não só demos a conhecer a Organização como também levamos a perspetiva da CPLP sobre grandes questões da agenda internacional. A CPLP cresceu como organização, alargou o número de observadores associados e consultivos e alargou também os horizontes para parcerias futuras, sendo prova disto a assinatura de protocolos de cooperação com várias organizações como é o caso do FIDA, da ONU Mulheres e a carta de intenções para um compacto financeiro com o BAD. A consolidação destas parcerias poderá alavancar o desenvolvimento social e económico dos Estados-Membros. Tive igualmente a feliz oportunidade de desenvolver um estimulante diálogo com outros espaços de base linguística e cultural, nomeadamente com a Organização Internacional da Francofonia (OIF), a Secretaria-Geral Ibero-Americana (SEGIB) e a Commonwealth. Em junho de 2017, as Secretárias-Gerais destas organizações e eu, na qualidade de Secretária Executiva da CPLP, lançamos o “Apelo por um Humanismo Universal”, uma resposta conjunta aos desafios e ameaças do mundo contemporâneo. No seguimento do Apelo, temos procurado identificar áreas e atividades para ações comuns, focadas especificamente nos jovens e nas mulheres, que constituem a maioria das nossas populações. Finalmente, promovi no Secretariado Executivo a elaboração e adoção de medidas, instrumentos e ferramentas de trabalho que visam dotar as atividades desenvolvidas de mais eficiência e transparência.  Deixo o Secretariado Executivo da CPLP com o sentimento de ter dado o melhor de mim tendo em conta o período de tempo e as circunstâncias que me foram proporcionadas.

 

Um dos pontos que apontou como prioridade quando iniciou funções foi dar continuidade aos esforços dos seus antecessores com vista a aumentar a visibilidade e o impacto da CPLP. Considera que este objetivo foi cumprido? Em que medida?

 

Este é um trabalho constante, que nunca está inteiramente concluído e que requer uma estratégia ao mesmo tempo permanente e flexível, para que seja possível adaptar-se às condições de cada momento. Por um lado, creio que a CPLP nunca teve tanta visibilidade internacional. O aumento exponencial de países interessados em adquirir o estatuto de Observador Associado da organização é uma clara demonstração disto. A CPLP tem estado presente em alguns importantes eventos multilaterais, como o Fórum Mundial das Águas, realizado em Brasília, em março de 2018, ou a conferência anual do Conselho Mundial de Alimentação, em Roma, em outubro de 2018. Tive a honra de representar a CPLP nesses eventos e também fui convidada para falar sobre a organização em instituições de renome mundial, como a Chatham House. No quadro da cooperação existente entre a CPLP, a OIF, a SEGIB e a Commonwealth, participei em alguns eventos de âmbito internacional na companhia das Secretárias Gerais daqueles organismos. Por outro lado, e talvez de forma paradoxal, a CPLP ainda é pouco conhecida nos seus Estados-Membros para além dos círculos diplomáticos e governamentais. Este é um desafio que ainda precisa ser vencido. Temos procurado fortalecer a nossa presença nos mídias sociais, que são o grande instrumento de divulgação do nosso tempo, e tive a oportunidade de conceder diversas entrevistas nas quais divulguei o trabalho da CPLP. Mas estou convencida de que ainda nos faltem ações de mais impacto e visibilidade, com efeito direto na vida dos nossos cidadãos, para que a imagem da CPLP seja mais difundida nos nossos países.

 

De que forma é que a CPLP tem vindo a privilegiar o aprofundamento da cooperação e amizade entre os seus membros? Quais têm sido as mais-valias nestas relações e as lacunas que ainda identifica?

Os Estados-Membros da CPLP já mantêm entre si intensas relações bilaterais. Nesse sentido, a questão que se coloca é qual o ‘valor agregado’ que uma organização multilateral como a CPLP pode proporcionar aos seus membros, ao acrescentar uma nova dimensão a estas relações já existentes. Estou convencida de que, apesar das nossas assimetrias e diferenças, funcionamos bem enquanto um coletivo, na medida em que possuímos muito em comum, além do idioma. E, justamente, por causa das nossas diferenças, temos muito a aprender uns com os outros. Penso especialmente na troca de experiências e boas práticas na formulação e execução de políticas públicas que enfrentem questões, oportunidades e desafios que são comuns a todos, mesmo que afetem cada país de forma distinta. Nesse sentido, a CPLP tem conseguido estimular e facilitar a formação de redes de instituições e técnicos em diversas áreas, como a saúde, a educação, a segurança alimentar, o trabalho e a cultura. Estas redes constituem espaços de partilha e aprendizagem mútua e de valor inestimável. O simples fato de servir como plataforma para a formação dessas estruturas já justifica a existência da CPLP. Porém, é claro que há ainda muito por fazer no sentido da ampliação destas redes e da sua replicação em áreas onde ainda não existem. Trata-se de um processo lento, que depende, também, de recursos nem sempre disponíveis. E talvez falte também associar, aos olhos dos cidadãos, a formação de melhores agentes públicos, para a qual a CPLP contribui de modo relevante em alguns setores, e a melhor prestação de serviços por parte dos governos.

 

A secretária-executiva da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) considerou que um dos grandes desafios da organização aproximar-se dos cidadãos. A mobilidade e a promoção da cooperação económica e empresarial são pilares importantes para essa aproximação?

Sim. Considero essencial que a CPLP alcance, com alguma urgência, avanços no que se refere à mobilidade dos seus cidadãos. Implementar plenamente e aprofundar os mecanismos de facilitação da circulação de pessoas no espaço da CPLP parece-me ser uma prioridade que espero ver abraçada pelo conjunto dos Estados-Membros a curto prazo. Identifico, ainda, a promoção da cooperação económica e empresarial como uma área a ser estimulada. O aumento dos fluxos de comércio e investimento entre os nossos países, ainda longe de atingir o seu potencial, terá certamente um impacto considerável no fortalecimento da Comunidade, para além dos ganhos puramente económicos. Setores empresariais dos Estados-Membros da CPLP têm-se organizado para formular propostas concretas nesse sentido. Cabe agora aos governos avaliar de que modo reagir a estas propostas.

 

A mobilidade é uma das questões principais em cima da mesa. Qual a importância do tema para os cidadãos da CPLP? Que avanços foram feitos?

 

Como referi anteriormente, a questão da mobilidade parece-me uma dimensão essencial e prioritária para o futuro da CPLP. O incremento da facilitação da circulação de pessoas entre os nossos Estados-Membros constitui uma aspiração legítima dos cidadãos da Comunidade e é um fator com o potencial de gerar, nos cidadãos, o sentimento de pertença a esta comunidade. Contudo, trata-se, ao mesmo tempo, de um tema de extrema sensibilidade para os governos dos Estados-Membros, tendo em vista as particularidades de cada um no seu contexto regional, bem como nos compromissos assumidos neste âmbito. Tais particularidades devem ser respeitadas e tomadas em conta se quisermos realizar avanços efetivos em termos de mobilidade. Há que se considerar, também, que já existem instrumentos e mecanismos, seja ao nível multilateral, seja na esfera bilateral, que, tomados, no seu conjunto, contribuem para uma maior mobilidade no espaço da CPLP. Creio que falta-nos esta visão geral da situação. No seguimento da Cimeira de Santa Maria, realizada em julho de 2018, o Secretariado Executivo recebeu o mandato de compilar toda a legislação existente nos Estados-Membros referente a este assunto, o que nos permitirá ter um panorama mais amplo das facilidades de que já dispomos. Devo registar, com satisfação, que conseguimos realizar, no primeiro semestre de 2018, uma reunião que congregou as autoridades das instituições que lidam com esta temática nos Estados-Membros, algo que não ocorria há muitos anos. A referida reunião permitiu que o diálogo sobre mobilidade fosse retomado ao nível técnico e foi alcançado um compromisso de tornar esses encontros regulares, numa base anual. Ao nível político, acredito que a prioridade dada ao tema da mobilidade pela Presidência de turno da CPLP, que será exercida por Cabo Verde até 2020, possibilitará que a discussão seja aprofundada e que, espero, resulte em medidas mais concretas.

 

A promoção da cultura e língua portuguesa são um pilar da CPLP. Que trabalho tem sido feito neste sentido?

A promoção e difusão da língua portuguesa no âmbito da CPLP ganharam novo impulso com a realização das sucessivas Conferências sobre o Futuro da Língua Portuguesa no Sistema Mundial, em Brasília (2010), Lisboa (2013) e Díli (2016) e com a adoção dos respetivos planos de ação que, tomados em conjunto, constituem uma sólida estratégia multilateral nessa matéria. Destaco, entre algumas iniciativas mais recentes, a elaboração, liderada pelo Instituto Internacional da Língua Portuguesa (IILP), do portal para professores de português como língua estrangeira, bem como o apoio dado pelo IILP à elaboração de Vocabulários Ortográficos Nacionais em vários Estados-Membros e o projeto em curso de elaboração do Vocabulário Ortográfico Comum. Trata-se de elementos essenciais para a implementação do Acordo Ortográfico.  Paralelamente, vêm crescendo, ano após ano, as celebrações do Dia Internacional da Língua Portuguesa e da Cultura na CPLP, assinalado a 5 de maio. Em 2018, por exemplo, ocorreu um dia de festividades relacionadas com a efeméride nos jardins das Nações Unidas, em Nova Iorque, com a presença do Secretário-Geral da ONU, Engenheiro António Guterres. Estas ações contribuem para dar visibilidade e projeção ao nosso idioma comum. No que se refere ao futuro, creio ser essencial o fortalecimento institucional e financeiro do IILP, para que o mesmo possa ampliar as suas ações de promoção do português dentro e fora dos nossos Estados-Membros. Vejo também com otimismo o crescente interesse dos Estados-Membros em atuarem conjuntamente na difusão da língua portuguesa, ao buscar sinergias entre as suas estruturas nacionais, como o Instituto Camões e os Centros Culturais brasileiros no exterior, por exemplo. Finalmente, caberá aos Estados-Membros decidir com que nível de intensidade e engajamento irão comprometer-se com a causa da adoção do português como língua oficial de organismos internacionais na esfera das Nações Unidas e seu sistema.

 

A CPLP tem vindo a ser alvo de interesse por outros países que não de expressão portuguesa. Como encara a adesão de França e outros Estados ao estatuto de países Observadores Associados da CPLP? Que contributo poderão estes países dar?

 

O interesse crescente que tem sido manifestado por diversos Estados em se aproximarem da CPLP e de institucionalizarem o seu relacionamento com a organização por meio da aquisição do Estatuto de Observador Associado demonstra um claro aumento da visibilidade e da projeção da CPLP na esfera internacional. Na Cimeira de Santa Maria, em julho de 2018, registamos um número recorde de aprovação de novos Observadores Associados: nove Estados e, pela primeira vez, uma outra organização internacional, a Organização de Estados Iberoamericanos para a Educação, a Ciência e a Cultura (OEI). Estou convencida de que estes observadores reconhecem na CPLP e no conjunto dos seus Estados-Membros um interlocutor relevante com o qual desejam estreitar relações em várias dimensões. Na perspetiva da CPLP, creio que, tomados no seu conjunto, os Observadores Associados oferecem a possibilidade de fortalecer a presença e a atuação da organização e dos seus Estados-Membros em outros fora multilaterais em que estes Observadores também são membros. Tomados, individualmente, cada Observador Associado oferece novas possibilidades de cooperação que será necessário desenvolver e aprofundar. Tive a oportunidade, durante o meu mandato, de promover dois encontros formais com representantes dos Observadores Associados, sendo que um deles reuniu pela primeira vez estes representantes e o Comité de Concertação Permanente da CPLP, formado pelos Representantes Permanentes dos Estados-Membros junto à organização. Uma segunda reunião neste mesmo formato deverá acontecer ainda até o final de 2018, já com a presença dos novos Observadores. São passos importantes no sentido de um maior envolvimento dos Associados nas atividades da CPLP.

 

A Guiné Equatorial aderiu à CPLP como membro de pleno direito em 2014, mediante o compromisso de promover a difusão da língua portuguesa e de abolir definitivamente a pena de morte. Qual a sua visão sobre esta matéria?

 

Pude verificar, ao longo do meu mandato, o empenho demonstrado pelas autoridades da Guiné Equatorial no sentido de cumprir os compromissos assumidos aquando da sua adesão à CPLP como Estado-Membro, em julho de 2014, por ocasião da Cimeira de Díli. Em termos de resultados concretos, é necessário reconhecer que resta ainda muito por fazer. Compreendo que cada Estado tem uma dinâmica interna própria e que nem sempre as mudanças que desejamos acontecem ao ritmo esperado pelos demais membros da Comunidade. Daí que, acredito também que cabe à CPLP apoiar a Guiné Equatorial a ultrapassar as dificuldades encontradas. Estou confiante de que a Guiné Equatorial saberá atender às expetativas criadas e concluir com sucesso o processo iniciado com a sua adesão à CPLP.

 

Que visão tem para o futuro da CPLP?

 

A CPLP representa, hoje, cerca de 300 milhões de cidadãos de nove Estados, distribuídos em quatro continentes e inseridos, cada um, em  contextos regionais específicos. Trata-se, assim, de uma organização de grande potencial estratégico, político e económico. Singular, na sua configuração geográfica, a CPLP carateriza-se, também, por uma enorme diversidade interna. Os Estados que a integram apresentam níveis muito distintos de desenvolvimento económico. E, no entanto, apesar de todas as assimetrias que nos poderiam separar, a CPLP conseguiu consolidar-se, ao longo dos seus 22 anos de existência, como uma organização capaz de construir consensos internos e de afirmar a sua presença no cenário internacional. Como já tive a oportunidade de mencionar, esta presença tem sido reconhecida por um número crescente de países, que tem manifestado de forma inequívoca o seu interesse em aproximar-se da CPLP e a ela associar-se por meio da obtenção do estatuto de Observador Associado. Não penso exagerar ao afirmar que a CPLP oferece um extraordinário e estratégico instrumento de desenvolvimento interno e de projeção internacional para os seus Estados-Membros que pode, pelo seu caráter transregional, contribuir para a dinamização das relações entre os vários continentes, a diversos níveis. Este instrumento pode tornar-se ainda mais relevante se tivermos em conta que, num mundo globalizado e interdependente, a busca de soluções coletivas para os desafios que se apresentam a todos os nossos países, mesmo que de maneiras e com intensidades diferentes, é cada vez mais urgente. A experiência recente em algumas áreas, como a segurança alimentar e nutricional, a saúde e o fomento do setor audiovisual, para mencionar apenas algumas, demonstra que, juntos, podemos conseguir avanços significativos, desde que se conjuguem a vontade política, as competências diversas distribuídas pelos nossos Estados-Membros e os meios adequados para a ação. Naturalmente, refiro-me aqui à CPLP no seu melhor. Como qualquer organismo intergovernamental, a CPLP reflete, na sua atuação, a convergência possível dos diferentes interesses nacionais que nela se projetam. Nesse sentido, a situação interna e a inserção internacional, real ou desejada, de cada Estado-Membro condicionarão, sempre, o seu envolvimento em qualquer organização em que participe. Desta forma, a plena realização do potencial da CPLP dependerá sempre do nível de engajamento de cada Estado-Membro nas atividades da organização. Os avanços concretos são, muitas vezes, obtidos lentamente e com dificuldades. As oscilações na evolução da situação interna de cada país fazem com que, em muitas ocasiões, as prioridades e os focos mudem, deixando, em segundo plano, ou enfraquecendo a vontade política que dá fôlego à Comunidade. Mas o fato de que um potencial não seja plenamente explorado ou realizado não faz com que ele deixe de existir. Faz parte do trabalho do Secretariado Executivo procurar alimentar a vontade política que nos sustenta e lembrar aos Estados-Membros o extraordinário instrumento de projeção internacional e de cooperação que têm nas mãos, sem nunca esquecer que caberá a eles decidir o que fazer com tal instrumento.

 

O português Francisco Ribeiro Telles será a partir de janeiro de 2019 o novo secretário-executivo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. Há algum conselho que gostaria de deixar ao seu sucessor?

 

O meu sucessor é um diplomata sénior e conhecedor da realidade de vários Estados-Membros da CPLP. Não tenho a menor dúvida de que ele está à altura dos desafios inerentes às suas futuras responsabilidades e que saberá imprimir o seu estilo e a sua marca ao Secretariado Executivo, como o fizeram os nossos antecessores e que eu mesma procurei fazer.

 

Que mensagem lhe aprazaria deixar a todos aqueles que tanto têm feito para o crescimento da comunidade de expressão portuguesa?

 

O idioma comum e os laços históricos e culturais que unem os Estados-Membros da CPLP foram, sem sombra de dúvida, fatores que forneceram uma base sólida sobre a qual construir a Comunidade como um projeto coletivo. Mas creio, também, que o fermento que permitiu que esses fatores facilitadores iniciais florescessem e dessem frutos foi a vontade política dos idealizadores e criadores da CPLP, e alimentada pelos seus sucessores, de constituir um organismo horizontal e democrático, onde todas as vozes fossem igualmente ouvidas e as decisões tomadas coletivamente. Um organismo – que não por acaso decidiu autointitular-se ‘comunidade’ – onde as assimetrias não se traduzissem, automaticamente, em hegemonias. O trabalho, a dedicação e o empenho de todos aqueles – mesmo aqueles cuja atuação não está diretamente vinculada à CPLP, que acreditam no extraordinário potencial que uma comunidade de expressão portuguesa representa, têm sido essenciais para alimentar e renovar o nosso património comum, bem como a vontade política de prosseguir os esforços no sentido da construção e do fortalecimento da nossa organização e da nossa comunidade de cidadãos. A estas pessoas, quero deixar, em primeiro lugar, um sincero e profundo agradecimento pelo que têm feito direta e indiretamente em prol da CPLP. Além disso, peço para que continuem a acreditar no projeto da Comunidade e que prossigam contribuindo para aprofundar os seus ideais, pois a sua incansável atuação é essencial para impulsionar o trabalho dos atores políticos dos Estados-Membros no sentido de dar prioridade à CPLP no contexto das suas respetivas políticas externas.

 

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