Ana Mendes Godinho: A trajetória de uma mulher em missão

No cenário político português, Ana Mendes Godinho destaca-se enquanto Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, mas também pela sua jornada pessoal e profissional multifacetada. Nesta entrevista, revelou-se como uma mulher que abraça múltiplas vidas e missões, sempre com o objetivo de transformar positivamente a sociedade.

 

 

Ana Mendes Godinho

 

 

O equilíbrio de várias vidas

Ana Mendes Godinho, uma mulher que se define “com várias vidas que se vão sucedendo e que fazem parte de um puzzle coletivo”, é uma figura que transita com sucesso entre a vida profissional e a familiar, sem abrir mão de nenhuma.

Com uma forte ligação à família, que considera um pilar essencial na sua vida, destaca a importância do equilíbrio entre as duas esferas: “Procurei ter uma vida familiar, que nunca me detivesse a uma participação muito ativa na sociedade em várias dimensões”. A educação dos filhos também é um pilar fundamental, guiada pelo lema “educar para a autonomia”. Uma vez que, acredita que cada indivíduo tem uma missão na sociedade, considera-se “uma mulher de missões em cada momento” encontrando satisfação em transformar vidas.

Licenciada em Direito, iniciou a sua carreira como advogada, mas logo se viu atraída pela função pública, assumindo o papel de Inspetora do Trabalho. “Assumi este papel também de serviço público ao serviço das pessoas”, evidenciando o compromisso com a justiça e igualdade. Mais tarde, consolidou a sua experiência em áreas estratégicas como Turismo e Investimento Financeiro, atuando como Consultora Jurídica e Vice-Presidente do Turismo de Portugal. O ponto de viragem na sua carreira política ocorreu em 2015, quando assumiu o cargo de Secretária de Estado do Turismo, e posteriormente, como Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, dedicando-se a uma das áreas mais desafiadoras do Governo: “Foram oito anos seguidos de funções de responsabilidade governamental”, relembra.

Ana Godinho destaca os desafios de ser mulher em cargos de liderança, observando que “a sociedade ainda não está preparada para que nos cargos de liderança sejam as mulheres a assumirem estas funções”. Para si, a igualdade no ambiente familiar foi crucial para conciliar a sua exigente carreira com a vida pessoal: “Tenho uma estrutura familiar que o permite, e assumimos muito que a missão que temos como família é conjunta”.

 

Iniciativas e impacto na sociedade

A gestão da pandemia da Covid-19 foi um período marcante na sua trajetória, comparável à crise de 2010/2011, onde “as taxas de desemprego foram superiores a 20% e houve cortes e congelamento salarial”. A resiliência e a capacidade de resposta do país foram determinantes para superar os desafios, especialmente com a implementação de Acordos em Sede de Concertação Social, que permitiram medidas “focadas e assertivas” para proteger os empregos.

No que diz respeito à valorização dos salários, Ana Godinho enfatiza o papel de dois acordos de valorização dos salários e da competitividade, que estabeleceram metas a médio prazo para a evolução do salário mínimo e dos salários médios. “Confesso-lhe que foi dos exercícios mais difíceis e exigentes que tive em cima da mesa, mas depois com um grau de satisfação brutal”, recorda.

Ana Mendes Godinho, liderou a implementação da semana de trabalho de quatro dias em Portugal, um projeto inovador que considera “bastante inspirador” para o futuro do trabalho. A iniciativa surgiu no âmbito da Agenda para o Trabalho Digno, com o objetivo de “desenvolver novas formas de organização do trabalho e do tempo de trabalho”. O projeto piloto envolveu 41 empresas e cerca de mil trabalhadores, com resultados positivos: “A percentagem de trabalhadores que dizia que era difícil ou muito difícil conciliar trabalho e família desceu de 46% para oito por cento”. Além disso, houve melhorias na saúde mental dos trabalhadores, com reduções significativas em sintomas de ansiedade, fadiga, insónia e estados depressivos.

Apesar de 85% dos trabalhadores aceitarem voltar ao regime anterior apenas com um aumento salarial superior a 20%, a produtividade manteve-se positiva. “As empresas reconheceram que o facto da pessoa dedicar um dia exclusivo às suas questões pessoais, acaba por nos dias em que está na organização, concentrar-se e dedicar-se muito mais”. Assim, 95% das empresas decidiram continuar com a semana de quatro dias após o período experimental. No entanto, a ex-Ministra afirma que “este tipo de soluções deve ser consensualizado e conciliado através do diálogo e não imposto”. Concluindo, destaca a importância de novas formas de valorização dos trabalhadores para o sucesso e a sustentabilidade das organizações. “Este tipo de novas formas de olharmos para a valorização dos trabalhadores como crítica das organizações é mesmo essencial, como também o oxigénio das organizações”, afirma.

Entre as conquistas que celebra, destaca a criminalização do trabalho não declarado, uma medida crucial para combater a informalidade, especialmente relevante para as mulheres que trabalham no serviço doméstico. Ana Mendes Godinho acredita que esta medida, no âmbito da Agenda para o Trabalho Digno, é essencial para combater a pobreza e a dependência ao longo da vida.

Ainda na sua trajetória, destacou o desenvolvimento do turismo português, considerando-o um “instrumento detonador de posicionamento e afirmação de Portugal”, não apenas como destino turístico, mas como polo de atração de investimento, novos residentes e mercados. Um exemplo disso, foi a aposta estratégica no mercado americano, que tinha como objetivo combater a sazonalidade e aumentar o valor deixado pelos turistas no país. Outro grande exemplo, é o papel do turismo na recuperação do património e no desenvolvimento do interior.

Em relação à Igualdade de Género, Ana Godinho acredita na necessidade de acelerar a inclusão das mulheres no mercado de trabalho, afirmando que se “a sociedade conseguisse acelerar mais do que o tempo normal levaria a que a participação das mulheres em condições de igualdade de oportunidades acontecesse”. Embora reconheça os progressos desde o 25 de Abril, destaca a persistência de obstáculos como profissões vedadas às mulheres e a disparidade salarial de 12% entre homens e mulheres, que considera “inaceitável”.

Numa tentativa de impulsionar a Igualdade de Género, a gratuidade das creches e a nova licença parental são medidas cruciais para Ana Godinho, uma vez que “liberta as mulheres para uma participação mais ativa no mundo do trabalho”. Estas ações promovem uma divisão equilibrada das responsabilidades parentais, a igualdade de género e a participação ativa das mulheres no mundo do trabalho.

 

 

 

 

Uma trajetória repleta de possibilidades

Na sua trajetória de dedicação ao serviço público, defende a participação ativa das mulheres na sociedade e na política. “Não há impossíveis e nós, mulheres, muitas vezes, somos demasiado exigentes connosco próprias e achamos que não conseguimos, ou que é impossível”, encorajando as mulheres a acreditarem em si mesmas e a romperem barreiras.

Durante o seu mandato como Secretária de Estado do Turismo, notou que nas fotografias oficiais, estava quase sempre rodeada por homens. “Era só uma evidência, porque quem estava nos lugares de topo eram homens”, sublinhando a predominância masculina nas esferas de poder. Determinada a mudar essa realidade, começou por garantir a presença de mulheres nas fotos oficiais e a incentivar ativamente a participação feminina em conferências e painéis, promovendo um ambiente mais inclusivo e equitativo.

Para a ex-Ministra, a política é uma arte de transformação social e uma ferramenta para construir uma sociedade mais justa. “É fundamental ter cada vez mais pessoas, jovens e mulheres e homens a participar na vida política ativa,” acreditando que a participação é crucial para a mudança.

A trajetória de Ana Mendes Godinho é um testemunho inspirador de como a dedicação ao serviço público pode resultar numa vida repleta de realizações e transmitir uma mensagem poderosa de que “não há impossíveis”. A sua história reflete a sua paixão e compromisso, mas também serve como uma chamada de atenção para todos os que procuram contribuir para uma sociedade mais igualitária e justa.

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