Universidade de Évora: Uma porta para o futuro

Em entrevista à Revista Business Portugal, a Reitora da Universidade de Évora, Professora Doutora Ana Costa Freitas, explicou-nos quais os desafios de liderar uma instituição desta envergadura e de que forma tem vindo a crescer e a afirmar-se no ensino português.

Apesar da evolução que tem havido na igualdade do género, continua-se a enfrentar barreiras no acesso das mulheres a cargos de maior prestígio, nomeadamente nas Universidades e Politécnicos. Posto isto, o que a motivou a candidatar-se em 2014, e pela segunda vez, a Reitora da Universidade de Évora?
O que me motivou foi ter um projeto para a Universidade e estar convicta que a sua implementação faria a diferença. Na verdade, o projeto estava realmente a meio, sendo certo, no entanto, que no final deste novo mandato, provavelmente, considerarei que ainda não está concluído, mas isso é uma questão que faz parte da vida: quando nos empenhamos muito, queremos sempre fazer mais! É bom que sejam só dois mandatos.

Quais são os maiores desafios de ser Reitora de uma Universidade?
Há imensos desafios, mas o maior é reunir a comunidade académica em torno de um projeto comum. Atendendo à dimensão da Universidade, não devemos ter cada um a remar para seu lado, o que implica redobrada atenção em termos de recursos humanos, comunicando, em contínuo, a estratégia, a visão e os valores da instituição. Esta é a vertente mais entusiasmante da gestão, depois há questões de fundo, como o subfinanciamento crónico ou a burocracia aliada à administração pública que nos condicionam e que acabam por resultar numa sensação de que o Ensino Superior só é importante em discursos políticos. Esta é a parte frustrante.
Outro desafio é estar-se sempre aberto a mudanças, a todos os níveis, e transversalmente aos três pilares fundamentais da nossa missão: ensino, investigação e transferência de conhecimento, mantendo o entusiasmo, a curiosidade, a motivação e o prazer naquilo que se faz e conseguir transmitir à Academia.

De que forma é que a sua experiência, nomeadamente a de Conselheira no Gabinete de Conselheiros Políticos do Presidente da Comissão Europeia, foi importante no seu desempenho enquanto líder académica?
Desempenhei funções num órgão em que as decisões são essencialmente políticas, a Comissão Europeia, e cujo processo de tomada de decisão é muito escrutinado e esse escrutínio, em si, é uma boa “escola”; é importante fazer sempre a avaliação de impacto de uma medida, ouvir pessoas com visões diferentes; faz parte do processo de decisão, o qual, no final, é sempre “solitário”.
Para além desta aprendizagem do mundo da política em contraponto ao mundo académico, foi também importante conhecer de perto os programas e políticas de apoio à investigação e à educação ao nível europeu.
Por outro lado, as diferentes culturas e ideologias, que se cruzam em Bruxelas são outra vertente que contribuiu para que esta fosse uma experiência enriquecedora.

Enquanto Reitora, qual a principal medida que já tomou e que estratégia assume para atrair novos alunos?
Para mim, o principal foi ter promovido o diálogo e o efetivo envolvimento das unidades de investigação na definição de uma estratégia transversal, no âmbito do último exercício de avaliação das Unidades de I&D pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia. Tivemos muito bons resultados, mas, principalmente, tivemos uma estratégia conjunta, o que foi muito importante.
No que diz respeito à captação de novos estudantes, os números falam por si: desde 2014 aumentámos cerca de 2000 estudantes, principalmente ao nível dos mestrados e doutoramentos e dos estudantes internacionais. No caso dos mestrados e doutoramentos, estou certa que os resultados da avaliação dos centros, oito dos quais obtiveram “excelente”, associados à aposta dos últimos anos no reforço da divulgação da Ciência, tiveram impacto no aumento de estudantes de segundo e terceiro ciclo.
No que diz respeito aos estudantes internacionais, temos vindo a afinar anualmente a estratégia, com resultados francamente positivos. A estratégia tem sido, fundamentalmente, afetar um serviço “dedicado” a estes potenciais estudantes, que acompanha de forma personalizada, o processo de candidatura, aproveitar todas as possibilidades de divulgação.
No âmbito do Concurso Nacional de Acesso aproveitámos o aumento de vagas para as IES do interior e obtivemos uma taxa de preenchimento de mais de 90 por cento, o que nos permitiu aumentar as vagas no primeiro ciclo, o que não conseguíamos há vários anos por via do congelamento do número clausus.

A Universidade de Évora tem-se afirmado como uma referência no ensino superior. Que trabalho tem vindo a ser feito para serem associados a uma formação de prestígio e ao desenvolvimento da cultura e da investigação realizada na região?
A avaliação da qualidade de uma Instituição de Ensino Superior é aferida pela qualidade dos profissionais que forma; são eles os nossos embaixadores e é a eles que devemos o reconhecimento da nossa qualidade. A Universidade tem uma cultura de qualidade transversal a toda a sua atividade. O nosso sistema interno de garantia da qualidade (SIGQ) foi um dos primeiros a ser certificado pela A3ES e no âmbito do processo de acreditação institucional a Universidade de Évora foi uma das cinco (entre as 60 instituições com processo de avaliação já concluído), que passaram com distinção, recebendo acreditação pelo período máximo de seis anos.
A missão que é intrínseca a qualquer instituição de ensino superior conduz a que promova o desenvolvimento, nomeadamente, aos níveis cultural e científico. Uma Universidade é motor de desenvolvimento da região em que se insere. Uma Universidade numa região do interior como Évora tem um impacto na coesão territorial que dificilmente outra qualquer política pública consegue atingir. O desenvolvimento de Évora enquanto cidade não se pode separar da existência da Universidade. Nós sabemos disso e a Cidade também.

Quantos alunos têm e que oferta formativa lhes disponibilizam?
Temos, neste momento cerca de 8000 estudantes em todas as áreas do conhecimento. Abrimos anualmente vagas para aproximadamente 150 cursos (41 de primeiro ciclo, 67 de Mestrado e 31 de Doutoramento).

Em termos de futuro, que projetos espera ainda realizar enquanto Reitora da Universidade de Évora?
Temos um desafio muito grande em termos de futuro: desenvolver a área da Saúde. Évora vai ter, espero, um novo hospital que será o Hospital Central do Alentejo. O Alentejo é uma região muito especial, tem características específicas, por via da demografia, do modelo económico das famílias, muito assente na agricultura (se bem que uma agricultura mais competitiva e mais moderna); no entanto, tem pouca gente e uma população muito envelhecida. Assim, a promoção do envelhecimento ativo, bem como os cuidados de saúde, desde a assistência domiciliária aos cuidados continuados, devem merecer um olhar diferente. Nós temos vindo a desenvolver investigação nestas áreas mais sensíveis para o Alentejo e que são menos desenvolvidas a nível nacional. Consolidar a investigação nestas áreas é uma prioridade! Temos que nos afirmar, internacionalmente de forma sólida nestas áreas! E vamos fazê-lo. Ao mesmo tempo, estamos a preparar formação pós-graduada diversa no domínio da Saúde ou áreas afins. O objetivo é estarmos preparados para avançar com um curso de medicina no momento em que o novo hospital estiver concluído. O meu desafio é preparamo-nos para que isto se consiga. Já não será comigo à frente da Universidade, eventualmente, mas queria deixar o caminho todo desbravado.

Fazendo parte de um universo diminuto de quatro mulheres à frente de Universidades em Portugal, que mensagem de incentivo deixa a mulheres que sonham alcançar um cargo de chefia?
A liderança de uma qualquer instituição é sempre um desafio. O objetivo não pode ser alcançar um cargo de chefia; é ao contrário: tem-se uma visão, um objetivo, para uma instituição. Concorrer a um cargo de chefia pressupõe que haja um programa, uma estratégia, nunca pode ser “querer ter poder só porque sim”. Tendo isto em mente é muito simples, é só necessário querer!

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