“Toda a investigação e inovação é um orgulho
Num ano marcado pela pandemia, as universidades portuguesas enfrentam novos desafios. Em entrevista à Revista Business Portugal, a Reitora da Universidade de Évora, Professora Doutora Ana Costa Freitas, abordou temáticas como a liderança no feminino e a aposta na modernização e internacionalização da universidade.
Numa edição em que falamos de líderes e empresárias de sucesso com uma atitude inovadora nas organizações, como tem visto o crescimento das mulheres à frente de grandes projetos?
O aumento do número de mulheres que têm vindo a ocupar lugares de liderança faz parte da evolução da sociedade. É obvio que atualmente existe maior atenção para as questões de género, mas também é verdade que, e atendendo à sua natureza, este assunto já deveria estar resolvido há muito tempo e encarado como natural. O mérito deverá ser determinante para se alcançar uma posição de liderança e não o género. No fundo quando olhamos para alguém que ocupa um lugar de liderança, independentemente do género, quero acreditar que seja por reconhecido mérito.
Houve uma evolução, mas continua a ser necessário sensibilizar a população em geral, para as capacidades das mulheres e para as leis que promovem a igualdade?
As mulheres têm sido, cultural e tradicionalmente, mais “destinadas” à família e associamos-lhe muito essa responsabilidade; de alguma forma vejo que é uma situação que tem vindo a alterar-se e decerto assim continuará. O principal nesta discussão é a mulher ter a liberdade de opção e igualdade de oportunidades. Não vejo qualquer problema se uma mulher pretender enveredar mais pelas responsabilidades domésticas desde que seja uma decisão consciente, por opção e gosto e nunca por imposição seja de quem for. A situação do teletrabalho pode ser bastante útil nesta questão, porque a mulher ou o homem podem preferir ficar em casa, é conveniente, é mais sustentável e pode aumentar a eficiência e rentabilidade, sem que tal situação penalize demasiado as empresas e/ou a sociedade em geral. Vamos certamente saber encontrar o equilibro para benefício das partes.
Por isso, é necessário continuar a falar mais sobre isto e haver mais estratégias de apoio à família. Na universidade de Évora criámos, recentemente, um gabinete para a igualdade de género. Quando falamos em igualdade de género, pensamos só nos problemas das mulheres, mas também há questões em relação aos homens. Tem de haver legislação sobre o assunto, sem dúvida, e mais legislação de proteção à família.
Na segunda tomada de posse da reitoria da Universidade de Évora referiu que as prioridades eram “concorrer a projetos europeus e conseguir mais financiamento para a academia, sobretudo em áreas estratégicas para a região”. Tem sido fácil atingir esses objetivos?
Definimos áreas estratégicas para a Universidade, as denominadas “áreas âncora”: mediterrâneo e sustentabilidade do território, património e artes, percursos de vida e bem-estar e aeroespacial e transformação digital. Nas duas primeiras áreas, somos muito reconhecidos, temos vários projetos europeus e centros de investigação excelentes. Os percursos de vida e bem-estar e o aeroespacial e transformação digital são áreas emergentes revelam a atenção da instituição para com a região. Relativamente aos percursos de vida e bem-estar, foi proposto nos novos estatutos, a criação de uma nova unidade orgânica a Escola de Saúde e Desenvolvimento Humano. O principal objetivo é iniciar formação na área da saúde (para além da Escola de Enfermagem) no sentido de se conseguir colmatar uma falha grande numa região demograficamente débil e envelhecida. Proporcionar uma vida útil com bem-estar, à sociedade no geral, e principalmente à população idosa é fundamental. Por último, no aeroespacial e transformação digital, a Universidade criou o Departamento de Engenharia para dar mais força à engenharia aeroespacial na região. Neste sentido, acho que temos conseguido. São estes projetos transversais que estão associados à modernização da Universidade e do modelo de ensino e investigação. Acho que temos conseguido.
A Universidade de Évora tem o único laboratório de investigação para a conservação do património cultural. É um orgulho para si enquanto reitora?
Toda a investigação e desenvolvimento nesta área são um orgulho. O Laboratório HERCULES – Herança Cultural, Estudos e Salvaguarda, é realmente uma enorme mais-valia com indiscutível reconhecimento internacional. Nesta área temos ainda outros Centros de Investigação, ligados às Ciências do Património, à Arqueologia, à História ou à História de Arte, áreas fundamentais na cidade de Évora. Criámos recentemente o Artéria Lab um espaço transdisciplinar de investigação e experimentação que pretende cruzar as áreas artísticas, tecnológicas e científicas com o objetivo de dar resposta aos desafios lançados pela comunidade, com especial foco no sector empresarial.
Este ano recebemos a primeira bolsa (Starting Grant) do Conselho Europeu de Investigação, na área da Arquitetura, a primeira atribuída em Portugal nesta área. Para além da internacionalização e dinamização de todas as áreas da Universidade, é também fundamental uma interdisciplinaridade entre as mesmas.
O contexto da pandemia colocou um conjunto de novos desafios às instituições?
A pandemia tem sido um desafio constante. Dentro da Universidade estamos convictos que o contágio, a existir, será residual e a maior parte dos casos, que temos tido, vêm do exterior. Como é natural, os estudantes vão a casa ao fim de semana e têm as suas convivências. Nas salas de aula cumpre-se o distanciamento e é obrigatório usar máscara, mas fora da Universidade já não podemos controlar. As pessoas têm medo e a tentação de passar tudo para o online é muito grande, mas não é possível e está, psicologicamente, errado. Em termos de educação, não é igual, porque os estudantes precisam da vivência da academia. Têm sido decisões difíceis, mas que têm corrido bem.
Quais as potencialidades que destaca na Universidade de Évora?
Viver e estudar em Évora é uma experiência muito agradável. A dimensão da Universidade de Évora permite uma ligação muito forte entre os estudantes, professores e funcionários, o que ajuda a diferenciar o nosso ensino. Faltava-nos dar uma especial atenção à questão da empregabilidade e no acompanhamento dos estudantes para além do curso, por isso temos feito em esforço nesse sentido. Foi criado o projeto “As empresas vêm até si” ou o “virtual recruitment day” que são exemplos dessa atenção e que estão a começar a dar frutos. Não queremos deixar os estudantes, no final do seu percurso académico, “desamparados”.
Mensagem de natal para a comunidade escolar.
A minha mensagem de Natal é de esperança para o futuro e acredito que vamos “esquecer” (não esquecendo) o impacto da pandemia nas nossas vidas. Os estudantes estão a atravessar um período muito difícil, porque o futuro para eles, neste momento, é ainda mais incógnito; desejo e espero que a comunidade escolar seja forte psicologicamente. Não podemos deixar que a pandemia transforme as nossas vidas.