A importância da maturidade alimentar

 

Ana Bravo, Nutricionista

 

A alimentação deve proporcionar sensações boas, tanto interna como externamente: tanto no corpo, nutrindo-o; como nas emoções, no que sentimos. Deve proporcionar prazer e bem-estar. Não há alimentos proibidos, e os alimentos especiais são tanto os que nos fazem bem como os que nos agradam. É verdade, podemos ver os alimentos como bons ou maus também conforme as emoções que nos proporcionam. O contrário também é importante. Todos sabemos que as emoções podem desencadear comportamentos alimentares. Sugiro que o leitor pare para pensar num momento em que esteve triste, irritado ou muito preocupado e comeu algo muito calórico e com pouco ou nenhum interesse nutricional. Refiro-me, por exemplo, a uma caixa de bombons, um pacote de batatas fritas ou de bolachas, um bolo cheio de chantilly ou um monte de queijos gordos. Conhece o cenário, não conhece? O que aconteceu antes e desencadeou tal episódio? E que aconteceu a seguir?

Ficou bem? Sentiu-se feliz? Provavelmente, sentiu um prazer imediato. E depois? Não estou a desvalorizar o momento, que, provavelmente, decorreu no seguimento de algo que considerava uma fraqueza, uma grande dificuldade, talvez uma das maiores tempestades da sua vida. Se ainda não sabe, dou-lhe uma novidade: todos passamos por aí.

Sugiro duas possíveis soluções, sendo que ambas têm de decorrer com amor. A primeira — e mais efectiva — passa por usar a «alimentação do sentir». Perante uma dificuldade, pare, observe e analise: o que desencadeou este episódio? É recorrente? Fá-lo sentir bem? O que deve mudar para ficar em paz com este tema? Bem sei que nem sempre a solução é clara, no entanto, ainda que não resolva no imediato, este exercício permite uma tomada de consciência importante, que, com o tempo, acabará por dar os seus frutos no momento certo. A segunda solução também passa por esse caminho de amor e aceitação: olhe para o que aconteceu com respeito, não se culpe mais e deixe ir. Siga, não viva no passado. O que importa é evitar que se repita. Claro que o mais importante será evitar esses momentos e, para tal, a primeira solução que lhe apresentei é a ideal. Se ainda não estivermos nessa fase, usemos a nossa experiência para melhorar a relação com a comida, tal como fazemos em várias áreas da nossa vida, seja nas relações, no trabalho ou na gestão familiar. Chamo a isto «maturidade alimentar»: se conhecemos os erros que nos fizeram sentir mal ou nos trouxeram arrependimento, procuremos não os repetir. Comer poderia ser um acto meramente racional, mas somos seres que sentem e se inundam de emoções.

Num mundo onde somos bombardeados com tanta informação, a ciência é o centro das atenções, sim, mas não podemos descurar as emoções, a realidade de cada um, o momento de observação, análise e aprendizagem por que cada um está a passar. Somos todos diferentes — únicos! — e estamos em fases de vida distintas, com um entorno familiar, social, profissional e emocional ímpar. Também é verdade que, além de não respondermos apenas a estímulos fisiológicos, cada um de nós tem uma realidade própria e não está limitado a um ambiente escrupulosamente condicionado, como acontece nos estudos científicos. Além disso, se há sociedades que não privilegiam o convívio à mesa, a nossa não é, felizmente, uma delas! Gostamos de comemorar degustando comida que estimule positivamente os nossos cinco sentidos, temos por hábito marcar um almoço para falar de trabalho, recebemos alguém em casa e servimos, no mínimo, uns petiscos, certo? Em algumas regiões do país, mais do que noutras, a comida e o convívio à mesa fazem-nos sentir mais seguros e confiantes em questões de trabalho, permitem-nos criar um ambiente romântico ou arranjar mais um motivo para conviver com a família e os amigos. Somos portugueses, e tudo isso faz parte da nossa cultura, que devemos manter e cuidar.

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