Saúde Feminina: O papel do ginecologista na vida de uma mulher

Em conversa com Ana Rosa Costa, Ginecologista/Obstetra no Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital de São João, a Revista Business Portugal foi saber qual o papel do ginecologista na vida da mulher.

Qual o papel do ginecologista na vida de uma mulher?
O ginecologista assume um papel primordial na vida da mulher, porque a acompanha durante a vida reprodutiva, continuando a acompanhá-la após a menopausa. Tem por isso uma posição privilegiada e importante na realização dos exames de rastreio adaptados às diferentes fases da vida, mas também na saúde da mulher em geral, aconselhando sobre hábitos de vida saudável para prevenção de outras patologias.

É de opinião de que as mulheres se sentem à vontade nas consultas de ginecologia, ou evitam e escondem sintomas?
A consulta de ginecologia tem as suas peculiaridades, pela “invasão da intimidade” das mulheres, e principalmente na primeira consulta não se sentem à vontade para falar de alguns assuntos, nomeadamente de sexualidade. Referem alguns sintomas físicos e só com o passar do tempo se sentem à vontade para abordar outros assuntos. Por vezes são os companheiros que verbalizam as queixas que as mulheres não referem. A nível da consulta hospitalar num hospital central e universitário, com colegas em formação e alunos a assistir, é mais difícil estarem à vontade. É frequente quando vamos realizar o exame ginecológico as doentes dizerem “não gosto nada de fazer este exame”, têm vergonha e ficam contraídas, principalmente se acham que vai ser doloroso.

Em relação à menopausa, como a caracteriza e quais os principais sintomas que lhe são associados e consequências a médio-longo prazo?
A menopausa é a data da última menstruação e significa a perda da capacidade reprodutiva da mulher e o declínio da produção de estrogénios pelos ovários. É este hipoestrogenismo o responsável pelos sintomas vasomotores (afrontamentos, suores noturnos…) e sintomas génito-urinários que interferem com a qualidade de vida da mulher. A médio e longo prazo, para além do agravamento dos sintomas génito-urinários, há aumento de risco de osteoporose e doença cardiovascular.

Qual a relação da mulher portuguesa com a menopausa? Quando sentem os sintomas procuram ajuda médica?
A maioria das mulheres portuguesas lida mal com a menopausa, porque associa este evento ao envelhecimento e habitualmente só procuram ajuda quando os sintomas interferem com a qualidade de vida, principalmente os afrontamentos que podem ser detetados por outros e que as embaraçam. A menopausa no século XXI tem de ser encarada de outra forma, porque acontece numa idade em que as mulheres estão ainda ativas profissionalmente, algumas com o adiar das gravidezes têm filhos pequenos; perdem a capacidade reprodutiva, mas mantêm-se sexualmente ativas, algumas com novos relacionamentos e precisam de se sentir bem para conseguirem corresponder às exigências do dia a dia. A idade média da menopausa mantém-se nos 51 anos e a esperança média de vida aumentou para 84 anos; vão viver grande parte da sua vida na pós-menopausa e por isso a necessidade de hábitos de vida saudável e terapêutica individualizada. Agora que têm mais anos de vida é importante dar “mais vida aos anos”.

Em relação às mulheres que sofrem AVV, de acordo com a sua experiência clínica, sente que as mulheres procuram ajuda ou sentem vergonha?
Algumas mulheres referem os sintomas (secura vaginal, diminuição da lubrificação e dor nas relações sexuais…), principalmente se têm atividade sexual. Há mulheres que não têm atividade sexual, mas referem que os sintomas interferem com atividades do seu quotidiano. Outras, por fatores culturais, religiosos e crenças sociais, não se sentem confortáveis a referir as preocupações relacionadas com o sistema génito-urinário. Nestas situações, somos nós, ginecologistas, ao observarmos os sinais de atrofia, que devemos ter uma atitude mais proativa questionando sobre a sintomatologia que por pudor não é referida espontaneamente.

É verdade ou mito que a vida sexual da mulher nesta fase da sua vida deixa de fazer sentido?
É mito. Muitas mulheres mantêm atividade sexual e as consequências a nível génito-urinário podem induzir ou agravar uma disfunção sexual. A disfunção sexual feminina é frequente, multifatorial, com vários tipos de disfunção sobrepostas e não escolhe idades. Uma mulher que tenha disfunção sexual previamente à menopausa pode sofrer agravamento se não fizer tratamento para uma situação que é uma consequência inevitável, gradual e progressiva e que poderá ter repercussões no relacionamento do casal, principalmente no caso de mulheres mais jovens com companheiros da mesma idade ou mais novos e que pretendem manter uma sexualidade satisfatória. Algumas mulheres que sofrem de atrofia vulvo-vaginal acham que é um fenómeno natural próprio da idade e, desconhecendo as opções terapêuticas, evitam ter relações sexuais devido à dor.

Tem alguma mensagem para as mulheres mais inseguras, quando precisam de ajuda? Quando deve uma mulher procurar uma consulta?
A mulher pode aproveitar as consultas de rotina para esclarecer dúvidas e deve procurar o médico quando surgem os sintomas. Quanto mais precoce a terapêutica mais benefícios terá. Este é um problema que está subdiagnosticado e sub-tratado. Estima-se que das cerca de 2 milhões de mulheres portuguesas em menopausa / pós-menopausa, 35% sofram de AVV. É importante que tenham a noção que há terapêutica e que não a aceitem como uma situação inevitável própria da idade e sem tratamento. É importante os médicos inquirirem as mulheres sobre sintomas, principalmente quando no exame ginecológico existem sinais de AVV. O diagnóstico é clínico, baseado nos sintomas e exame ginecológico, e é importante a intervenção precoce para minorar as consequências negativas nas atividades diárias, na sexualidade, e na qualidade de vida em geral.

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