atelier 405

Anabela Coelho para além de ser mentora do projeto Atelier 405, é também partner na Engel & Völkers da Quinta do Lago e ainda sócia da SeasonConquest.

Conte-nos o seu percurso profissional e como concilia estas atividades. Qual delas lhe dá mais gozo?
Iniciei os estudos com equipamento na Escola Soares dos Reis e continuei em Arquitetura na ESAP. Conforme fui sentindo outras curiosidades e necessidades continuei a estudar, fiz uma pós-graduação em Cultura e Ciência do Vinho na Católica, Project Management na PBS e recentemente Luxury Real Estate no ISEG. Comecei a trabalhar em arquitetura no quarto ano de faculdade e até hoje nunca mais parei. Como trabalho de fim de curso, projetei o Museu do Vinho, fui à Câmara de S. João da Pesqueira apresentar o projeto e propor a construção do edifício, e construíram. Na cave de um amigo, eu e o meu atual sócio no Atelier405, juntamos colegas da faculdade e desenvolvemos o projeto de execução do Museu, a partir desse momento nunca mais parámos e continuamos a projetar edifícios públicos, residenciais e comerciais.
Como dizia o Oscar Niemeyer, “A gente tem é que sonhar, senão as coisas não acontecem”. Esta é uma filosofia de vida e espero que seja sempre assim.
Em 2014 surge a Seasonconquest, uma empresa de gestão e outsorcing comercial que neste momento emprega 30 pessoas, um projeto muito interessante e dinâmico que acompanha as necessidades do mercado.
Em 2018 avançámos com o negócio do imobiliário e tornámo-nos franchisados da Engel & Völkers na Quinta do Lago, uma marca internacional de imobiliário de Luxo.
No dia a dia desenvolvo muitas atividades diferentes, que se complementam e que me dão imenso gozo. Com muita organização, gestão de prioridades, equipas de profissionais focados e uns excelentes parceiros tudo se consegue.
Qual delas a preferida? Arquitetura é Arquitetura e é daquelas profissões que podemos continuar a desenvolver, não há arquitetos reformados e esta ideia é muito motivadora, não existe fim anunciado. No café temos ideias para uma casa, para uma praça, numa viagem surge a solução de um problema, a cabeça está sempre a trabalhar, o bloco de esquissos está sempre no bolso, as toalhas de papel das mesas dos restaurantes ficam sempre cheias de projetos, o ritmo das obras, as equipas, tudo isso é viciante. E o gozo de ver uma obra finalizada e das pessoas a desfrutar dela é indescritível. Acho que é por isto que os arquitetos são tao mal pagos (risos). O imobiliário é fantástico e é muito compensador trabalhar no Algarve, um cantinho do mundo realmente especial onde se consegue ter uma boa qualidade de vida. Aproveito para dizer que estamos a recrutar e as mulheres têm um carisma muito especial, normalmente conseguem ter muito sucesso no imobiliário.
Um dos aspetos que mais aprecio é o facto de que, tal como na arquitetura, para fornecermos um bom serviço temos que conhecer muito bem os clientes e criar uma verdadeira relação, é muito mais que um negócio.
A nossa equipa é internacional e todos os dias lidamos com clientes de todas as partes do mundo, com histórias de vida e de negócios interessantíssimos. Gosto muito deste contacto com pessoas e da dinâmica dos negócios.

Sendo uma arquiteta que acabou por enveredar também no ramo do imobiliário de luxo, que mais-valias considera que profissionais como a Anabela trazem para este mercado? Sente que há necessidade de haver uma maior aposta em mão-de-obra mais qualificada?
Os arquitetos concretizam sonhos, necessidades e resolvem problemas, o imobiliário é isso também. Um arquiteto desde que começa um projeto até ser construído são normalmente 2/3 anos, uma propriedade pode ser vendida em três meses. Esta capacidade de resiliência é uma grande vantagem, assim como o conhecimento técnico sobre os imóveis, a sua avaliação, descrição e o mais importante que é a qualificação de clientes e acompanhamento nas suas escolhas.
Quanto mais experiência profissional e diversificada melhor. Durante muito tempo o imobiliário era visto como um “escape” para a falta de trabalho, mas os tempos mudaram e cada vez mais se está a profissionalizar. Acredito que é muito importante a formação certificada e constante, o desenvolvimento de carreira e só assim se consegue oferecer um serviço de valor acrescentado, como é pratica em muitos países.
Os clientes merecem e exigem esse profissionalismo e, neste momento, já temos no mercado profissionais altamente qualificados a especializarem-se no imobiliário e isso é muito positivo.

 

Recentemente, foi aprovado o novo Orçamento de Estado para 2020. Que impacto é que as alterações apresentadas representam para vocês?
O que realmente nos preocupa é o tempo, as burocracias, os licenciamentos que ficam anos sem resposta e a instabilidade. É muito difícil e por vezes embaraçoso explicar a um cliente estrangeiro que se pode demorar dois anos a licenciar um projeto que demorou seis meses a ser feito. Também não é percetível a quantidade de entidades que têm que se pronunciar e da falta de comunicação e entendimento entre elas num tempo útil. Esta incerteza afasta o investimento, reduz a oferta e os preços tendem a ser desajustados. Exatamente o contrário do que pretendemos. Precisamos de planeamento, de processos simples, rápidos e de estabilidade.

A legislação portuguesa é favorável nas vossas áreas de negócio? Se pudesse, o que mudaria?
Na arquitetura, a legislação evoluiu no sentido do aumento da responsabilização dos técnicos, o que seria útil se depois na prática o processo de licenciamento fosse mais rápido o que não acontece. Precisamos de uma legislação que seja possível de por em prática com os meios que temos atualmente, ou estamos sempre a falar de utopias.
No imobiliário, a legislação não é muito clara e este vazio dificulta a regulação e profissionalização do mercado. Medidas, como formações indispensáveis e contínuas dadas por profissionais da área e a obrigatoriedade de mediação profissionalizada nas transações imobiliárias, trariam benefícios para os clientes.

Cada vez mais, há uma maior sensibilidade e preocupação com o meio ambiente, muito por causa das alterações climáticas a que assistimos e por ser um tema cada vez mais debatido pelos líderes mundiais. Como vê o futuro da arquitetura e do imobiliário?
Vejo na arquitetura pelo menos duas vertentes principais: edifícios com design sustentável e a introdução de alta tecnologia. Com metade da população mundial a viver nas cidades, estas tendencialmente serão mais verdes, com menos carros, mais transportes públicos, ciclovias e espaços multifuncionais. Talvez estejamos a falar de cidades verticais, com grandes torres elevadas do solo, com estacionamentos nas coberturas, recolha de águas, turbinas de produção de energia eólica, edifícios cobertos de vegetação, pisos que rodam para melhor exposição solar, materiais reciclados… Neste caso, a tendência é espaços pequenos, multifuncionais e em regime de partilha muitas vezes.
Ou poderemos estar a falar da necessidade de diminuição de construção nas cidades e privilegiar a ocupação das zonas rurais, onde se pode desenvolver a autoconstrução por exemplo, aproveitando as possibilidades das tecnologias que permitem trabalhar à distância? Transportes públicos mais funcionais que permitem reduzir o tempo de viagens, carros sem motorista…
O mercado imobiliário está a reagir a estas preocupações, manifestando-se nas preocupações energéticas, na tipologia e na possibilidade de transformação dos espaços ao longo do tempo, na tendência de áreas mais reduzidas nas casas, preferências por espaços de uso comum e os tipos de materiais utilizados. Cada vez mais, a expressão LESS IS MORE de Mies Van Der Rohe faz sentido.

Fazendo parte de um universo diminuto de mulheres em cargos de chefia, que mensagem de incentivo deixa a outras mulheres? Concorda que, em Portugal, é necessário haver mais apoio às mulheres empresárias?Este universo diminuto deve ser invertido, não é justo. Homens e mulheres são diferentes e é nessa diferença que está uma diversidade enriquecedora que todos podemos usufruir. Um ambiente empresarial com uma boa proporção entre bons profissionais masculinos e femininos é muito mais rico e justo. Como queremos uma sociedade justa com as mulheres se é maioritariamente gerida por homens? Precisamos de reconhecimento e de ganhar o merecido espaço.
Partindo de um princípio em que uma mulher não deve ser obrigada a escolher entre uma carreira ou uma família, precisamos de nos educar de forma a dividir tarefas e responsabilidades em casa, na educação e acompanhamento dos filhos e de toda a família. O Estado neste aspeto tem um papel fundamental e está a falhar, são inúmeras as medidas adotadas noutros países que aqui são sonhos longínquos.
Nós precisamos é de ações de incentivo, somos fortes, excelentes profissionais e com as mesmas capacidades dos homens. O que nós precisamos é de uma educação não diferenciadora, de colegas que nos apoiem e respeitem e de acabar com estes estereótipos. Estas mudanças de mentalidade não se resolvem num curto espaço de tempo, acho que só apoiando as mulheres empresárias é que podemos falar de igualdade de oportunidades. Poderemos estar a falar de apoios às empresas através de apoios financeiros, benefícios fiscais e acompanhamento.
Precisamos de medidas que apoiam o empreendedorismo feminino e que ajudem as mulheres a criarem negócios, isto é muito importante.

You may also like...